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Percepção pública da ciência exige novos atores

As pesquisas sobre indicadores de percepção pública da ciência têm sido realizadas nos Estados Unidos e em países da Europa já há bastante tempo, e começam a ser difundidas para outros lugares, tais como o Brasil e, mais recentemente, a Índia, onde foram entrevistadas 65 mil pessoas, em pesquisa publicada em outubro de 2004. Ao longo do tempo, essas pesquisas foram assumindo novos contornos e metodologias e hoje consideram um maior número de elementos de análise e novos atores, aproximando-se mais da realidade sobre o que a população pensa, se interessa e deseja para o campo de C&T. Este tema foi apresentado em palestra de Martin Bauer, professor de psicologia e metodologia de pesquisa da London School of Economics, da Inglaterra, realizada no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, da Unicamp, no dia 12 de abril.

Para Bauer (foto) a intermediação entre a ciência e público exige cuidados para não se perder a neutralidade

O principal objetivo dessas pesquisas sobre percepção pública da ciência é auxiliar os formuladores de políticas públicas a definirem os rumos de ações e de financiamentos para as áreas ligadas à ciência e à tecnologia, o que, segundo Bauer, não se sabe se realmente acontece. De qualquer modo, a partir dessas pesquisas, tem sido possível conhecer o que a população sabe sobre temas científicos - alguns aprendidos na escola e outros não -, e verificar como os indivíduos se comportam diante desses temas, se há interesse sobre eles, se há aprovação ou rejeição, como buscam informações, entre outros parâmetros. No Brasil essa área de estudos ainda é incipiente e Bauer recomenda que seja ampliada.

A evolução das pesquisas sobre percepção, segundo o professor inglês, compreende três fases. A primeira, dos anos 60 aos 80, baseada na idéia do déficit de aprendizado, tinha como hipótese que o conhecimento científico seria um corpo reconhecível de informação codificada, universal, objetiva, passível de medição, a partir da qual se estabelece seu grau de déficit de compreensão. O "modelo do déficit" supõe que essas falhas de conhecimentos poderiam ser corrigidas por meio, principalmente, de reforço ao ensino de ciências nas escolas. Na segunda fase, da metade dos anos 80 até início dos 90, os pesquisadores já começaram a examinar não apenas o que o público conhecia sobre a ciência, mas também se compreendia como a ciência é produzida, quem faz a pesquisa, como é financiada, entre outras questões que envolvem o tema.

No início dos anos 90, os estudos avançaram para um modelo mais democrático que, considera a análise de causas culturais e institucionais para explicar certos desentendimentos relativos à ciência por parte do grande público, além da aceitação ou reprovação ao desenvolvimento científico e tecnológico. Os pesquisadores entenderam, a partir dessa nova abordagem, que um indivíduo pode ser contrário aos transgênicos por questões políticas e não por desconhecimento da tecnologia. Da mesma forma, preceitos religiosos podem influenciar negativamente a aceitação de pesquisas com células-tronco embrionárias, mesmo que o indivíduo conheça profundamente o processo científico desse tipo de pesquisa.

Mas esse modelo mais democrático das pesquisas sobre percepção pública da ciência requer, segundo Bauer, um novo conjunto de ações, como a realização de fóruns de debates, com maior participação da sociedade em conferências de deliberação e de consenso. Essas, por sua vez, exigem a inclusão de novos intermediários dessas discussões, como os consultores - profissionais do setor privado que não realizam as pesquisas, mas tornam-se responsáveis pela organização desses fóruns.

Porém, transferir essa atividade antes de responsabilidade de governos, supostamente mais neutros, a esses profissionais da iniciativa privada, exige cuidados para que a neutralidade necessária seja preservada. Uma maneira sugerida pelo pesquisador, é que a atividade seja financiada não apenas por um "cliente", mas por todos os interessados nos resultados desses indicadores de opinião pública. Uma pesquisa sobre transgênicos, por exemplo, não deve ser financiada apenas pela empresa de biotecnologia interessada na aprovação de suas novas sementes, mas também por um órgão de defesa do consumidor, pelo governo e por uma associação de pesquisadores.

Sobre a realização de pesquisas mais específicas como a sugerida acima, Bauer acredita que apesar de serem interessantes, corre-se um risco ao especificar demais, deixando que o tema perca a comparabilidade entre países, estados, sociedades - um dos usos dos indicadores -, já que ficaria sujeito a características culturais muito particulares de cada grupo. Para ele, é mais importante que se mantenha o indicador geral sobre percepção pública da ciência, até mesmo para que essas pesquisas mais individualizadas possam ser comparadas com esses, a exemplo do que tem feito o "Eurobarômetro", que lançou em janeiro sua última edição, e do qual Martin Bauer participa como um dos coordenadores da pesquisa de indicadores de percepção sobre biotecnologia.

Atualizado em 13/04/05
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