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Projeto usa tecnologia para resgatar cultura dos índios Bororo

O projeto Mero Ore Eda, do Instituto das Tradições Indígenas (IDETI), recebeu neste mês 10% do seu orçamento - estimando em 3 milhões - para dar início à primeira fase do trabalho. O projeto, que conta com o apoio do Ministério da Cultura (Minc), visa resgatar a cultura dos índios Bororo, situados no sudoeste de Mato Grosso, por meio da reconstrução da aldeia tradicional, mas com a infra-estrutura tecnológica disponível atualmente. As aldeias contarão com instalações de telefones fixo, energia elétrica e rede de água e esgoto. O projeto parte do princípio que é possível criar um novo modelo de relação entre o povo indígena e a sociedade branca, que associe modernidade e tradição, preservando, assim, a riqueza da diversidade cultural dos povos indígenas.

Angela Pappiani, responsável pelo Departamento Cultural do IDETI, afirma que o desejo de resgatar a cultura dos Bororo é antigo, mas que o projeto foi formalmente criado com sua inserção no IDETI, em 2004. Em abril do mesmo ano, o Projeto foi aceito pelo Minc, quando o ministro Gilberto Gil visitou a aldeia dos Bororo e recebeu das mãos dos próprios indígenas a proposta do projeto.

Os rituais, a língua e as cerimônias dos Bororo estão hoje praticamente extintos, sendo que os jovens da etnia não mais conhecem seu idioma e sua história. Os Bororos apresentam atualmente altos índices de suicídio, de alcoolismo e de prostituição, existentes a partir do contato com os brancos, que se intensificou nos últimos 100 anos.

De acordo com Pappini, no início do século XX predominava a idéia de integrar o índio na sociedade. "A visão da época era de que o índio deveria desaparecer, se mesclar na sociedade brasileira. Os jovens Bororo eram proibidos de falar a língua nativa e as cerimônias eram também proibidas", relata. Ultimamente, novas lideranças estão percebendo que o melhor caminho é o do resgate cultural, de fortalecer a identidade, de entender quem eles são, para o povo não se extinguir definitivamente. "Essa quebra de identidade é que gera o alcoolismo, a prostituição, a violência, todos os problemas que a aldeia vem enfrentando".

Ações

O projeto começará com a recuperação da arquitetura tradicional da aldeia, espaço das relações sociais dentro da tradição Bororo. Engenheiros e arquitetos, com a ajuda dos velhos Bororo, tentarão reconstruir a tradicional aldeia de palha trançada, juntamente com a construção de um centro cultural e mais 13 casas, também de palha trançada, com rede de energia, telefonia, água e saneamento. Para Pappiani, a aldeia se assemelha a uma cidadezinha de interior, com casas de alvenaria separadas por arame farpado. O projeto se propõe a fazer com que os jovens conheçam essa arquitetura tradicional, valorizando o conhecimento dos mais velhos.

Além da reconstrução da aldeia, o Projeto conta com oficinas que funcionarão na própria aldeia. Entre as atividades, estão programadas aulas da língua nativa, de dança, artesanato, mitologia, pintura corporal e de cerâmica, que serão documentadas em áudio, vídeo e em fotos por profissionais e por jovens indígenas que passarão por um curso de capacitação. Histórias antigas, de conhecimento dos Bororo mais velhos sobre a criação do mundo, o significado da vida e da morte, entre outras, serão registradas em livros ilustrados pelos Bororo mais jovens. Do mesmo modo, os cantos, sempre presentes em rituais, serão registrados em CDs. Segundo Pappiani, essa tecnologia é uma aliada para vários povos indígenas nesse projeto de recuperação de suas tradições. Um projeto semelhante ocorreu em 1998 com a participação dos xavantes, em que livros feitos por eles continham suas histórias em sua escrita, com fotos da etnia e desenhos feitos pelos mais jovens.

O isolamento do povo indígena, para Pappiani, traz prejuízos e favorece a violência e o desrespeito aos seus direitos. "A medida que eles estão 'conectados' com o mundo, eles podem reivindicar. A tecnologia se torna fundamental nesse processo", ressalta. As casas no território Bororo, afirma, já possuem energia elétrica, televisão, telefone, em função das missões religiosas, mas eles foram usados no sentido da aculturação. O Projeto tem o objetivo inverso: fazer com que os Bororo tenham tecnologia, mas a favor deles. "Os índios já têm contato com essas 'modernidades', só que de forma colonialista. É preciso continuar se apropriando dessa tecnologia, só que da maneira deles", conclui.

Atualizado em 14/01/05
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