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Esterilização pós-parto é prática comum
em portadoras de HIV em SP

Artigo publicado na revista Social Science and Medicine faz uma levantamento e análise comparativa entre a prática de esterilização pós-parto em mulheres HIV positivas. A pesquisa foi realizada apenas no Sistema Público de Saúde das cidades de São Paulo e Porto Alegre, em função dos altos índices de incidência de Aids: 65 casos para cada 100 mil habitantes, em Porto Alegre, e 38 casos para cada 100 mil em São Paulo. Apesar da legislação brasileira permitir que a esterilização seja feita apenas 41 depois do parto, 51% das mulheres soro-positivas que optaram por este método contraceptivo em São Paulo, o fizeram logo após o parto, encorajadas pela equipe médica.

Nos últimos anos, o aumento do número de mulheres contaminadas com HIV em todo mundo tem favorecido a disseminação do uso da esterilização - ligação de trompas - como método contraceptivo. Segundo dados do Ministério da Saúde, em 2003 existiam no Brasil 89.527 casos oficiais de Aids entre mulheres, a maior parte em idade reprodutiva. Mas, segundo alguns especialistas esses números podem ser bem maiores, chegando a 218 mil mulheres maiores de 14 anos infectadas pelo HIV. Também cresceu a transmissão heterossexual do vírus, que em 2000 foi responsável por 93% dos casos entre mulheres, comparado com 62% dos casos em 1991.

Os autores da pesquisa, pertencentes ao Núcleo de Estudos da População (Nepo) da Unicamp, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade do Texas e Austin (EUA) e Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, afirmam que muitos são os motivos que levam as mulheres soro-positivas a decidir por não ter filhos. Entre eles está o risco de transmissão vertical do vírus (durante a gestação ou parto), complicações para saúde da mulher e dificuldades futuras na criação do filho.

O artigo cita um estudos recente realizado em São Paulo com 1068 mulheres grávidas infectadas, entre as quais 87% não desejavam mais ter filhos. Outra pesquisa, feita em 1997 com 148 mulheres que freqüentavam a clínica do Centro de Referência de DST/AIDS de São Paulo, constatou que 79% das mulheres disseram não a maternidade. Essa "demanda" na capital paulista tem sido correspondida pelo Sistema Público de Saúde, onde mais da metade das esterilizações realizadas em mulheres soro-positivas são pós-parto. Um procedimento comum, mas ilegal. De acordo com a lei 9263, de agosto de 1997, a esterilização voluntária feminina e masculina é permitida apenas para maiores de 25 anos ou quando o casal já tem dois filhos. Além disso, é necessário haver um período de 60 dias entre o pedido e a realização da esterilização e a cirurgia só pode ser feita após 41 dias do parto.

Um dos dados que mais chamou a atenção dos pesquisadores diz respeito à diferença significativa entre o índice de esterilização pós-parto encontrado nessas duas cidades. Enquanto em São Paulo, 51% das mulheres HIV positivas que procuram clínicas públicas são esterilizadas após o parto, apenas 4% são esterilizadas nos hospitais de Porto Alegre. Outros números marcam ainda mais essa diferença: 68% das paulistanas soro-positivas que desejam se submeter a esterilização pós-parto conseguem fazer a cirurgia, contra apenas 10% em Porto Alegre. Os números levantados mostram também que o índice de esterilização entre mulheres portadoras de HIV é sensivelmente superior ao da população feminina geral: 3,4% em São Paulo e apenas 1,1% em Porto Alegre. Os resultados sugerem que as pacientes soro-positivas sofrem forte pressão para não ter mais filhos no futuro e que a esterilização feminina é a maneira preferida para alcançar este objetivo.

Essa diferença na quantidade de procedimentos de esterilização realizados nas cidades analisadas pode ser entendida, principalmente, pela diferença de acesso a esse procedimento nos sistemas públicos de saúde dessas duas cidades e pela própria postura da equipe médica em relação à esterilização. "O que fica claro, a partir das evidências qualitativas e quantitativas, é que a decisão das mulheres HIV-positivas - que têm filhos em hospitais públicos - de se submeter ou não à esterilização fica a mercê dos médicos", afirmam os autores da pesquisa. O depoimento de algumas mulheres esterilizadas confirma a importância do incentivo e encorajamento da equipe médica na hora da decisão. Enquanto em São Paulo, as mulheres infectadas pelo HIV seriam incentivadas a fazer a esterilização após o parto, nos hospitais de Porto Alegre isso não ocorreria.

Os pesquisadores enfatizam que a preferência ou demanda por esterilização seria também condicionada pela oferta limitada de métodos contraceptivos alternativos no Sistema Publico de Saúde. Assim, salientando a necessidade de expandir os recursos aplicados em opções contraceptivas, bem como urgência de uma discussão sobre o tema pela comunidade médica e Ministério da Saúde buscando um tratamento adequado e homogêneo da esterilização de portadoras de HIV.


Esterilização em outros países

Na Tailândia, 44,4% das mulheres soro-positivas fazem ligação nas trompas logo após o parto. No México, esse
número chega a 68%.
Trecho de entrevista

"A médica me perguntou se eu queria fazer uma esterilização. Eu respondi que ainda não sabia, que tinham dúvidas. Ela me perguntou que tipo de dúvidas eu tinha. Eu lhe disse que pensava que, caso a cura fosse encontrada, eu poderia querer ter outros filhos e se estivesse esterilizada não poderia. A médica me perguntou então se eu realmente esperava que a cura fosse encontrada a tempo de eu poder ter outro filho". Paciente soro-positiva em São Paulo reproduz conversa que teve com sua médica.
Atualizado em 22/03/05
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