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Ceará investe na segurança hídrica de indústrias e exclui comunidades

Está em andamento no Ceará a construção do maior canal da história do estado: o Canal da Integração, mais conhecido como "Eixão", com 255km de extensão e uma vazão de 22m3/s. Em dezembro de 2004 foi inaugurado o primeiro trecho do canal, que liga o Açude Castanhão a Morada Nova. No projeto do canal, a população cearense aparece como uma das maiores beneficiadas com os 900 milhões de reais investidos na obra. Porém, comunidades locais temem os impactos da obra e denunciam que o canal servirá principalmente aos interesses da capital, de megaempresários do complexo industrial-portuário do Pecém e de grandes projetos de irrigação. "Infelizmente, o discurso de 'vamos matar a sede e a fome na região' serviu apenas para convencer a população e aprovar as verbas", lamenta José Josivaldo Alves de Oliveira, membro da direção nacional do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB).


Imagem do primeiro trecho do Canal da
Integração
(Castanhão- Morada Nova)
site da Secretaria dos Recursos Hídricos do Ceará

O Canal da Integração esta sendo construído com financiamento do Banco Mundial e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pretende realizar a transposição das águas do Açude Castanhão, fazendo a integração das bacias hidrográficas do Jaguaribe e região metropolitana. Segundo José Maria de Andrade, representante do Comitê das Bacias Hidrográficas do Médio Jaguaribe, que tem participado das reuniões com a Secretaria de Recursos Hídricos, os 13 municípios que serão cortados pelo rio artificial criado pelo canal não terão acesso a água. "O canal está sendo construído para atender os grandes grupos e dar sustentação aos planos ambiciosos do governo do estado para o complexo industrial-portuário do Pecém", diz. Na avaliação de José de Oliveira, "o canal é como a construção de uma grande avenida: eu só me beneficio dela se tiver carro ou usar algum tipo de transporte". Ao ser consultada sobre a obra, a Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (COGERH) do Ceará também informou que o porto de Pecém será o grande beneficiado com a transposição feita pelo Canal da Integração.


Mapa do projeto do Canal da Integração
site da Secretaria dos Recursos Hídricos do Ceará
Clique no mapa para ampliar


O complexo industrial-portuário de Pecém ainda está em construção e é considerada a menina-dos-olhos do governo do estado. Dentro dos planos ambiciosos de desenvolvimento econômico o complexo desempenha um papel estratégico e o Canal da Integração é vital para sua existência. As indústrias que estudam a possibilidade de inclusão no complexo, por exemplo, exigem uma segurança hídrica de, no mínimo, 20 anos para se instalarem no Ceará.
"A integração de rios no Ceará não resolverá o problema da seca na região. Por isso, mesmo vivendo no semi-árido e sofrendo com a seca somos contrários a transposição das bacias do Ceará e do São Francisco", diz Oliveira, manifestando a opinião do MAB.

Organização das comunidades será desafio
Além de não serem beneficiados, as populações locais temem sofrer os impactos sociais e ambientais da obra. Toda a região onde o canal vai passar será desapropriada. Embora existam projetos de reassentamento, experiências anteriores, como a construção do Açude do Castanhão, deixam as comunidades preocupadas. (leia sobre os impactos da construção do Castanhão na reportagem "Grandes obras priorizam o aguabusiness e intensificam desigualdades"). Para o diretor do MAB, um dos maiores desafios será o de conseguir organizar as comunidades locais para lutarem por seus direitos. "Ainda não sabemos se as comunidades vão reagir, mas temos certeza que se não houver organização os prejudicados ficarão à margem da água e não poderão utilizá-la".

O Comitê de Bacias também sofre com a falta de organização e participação das comunidades. Embora tenha sido criado em 2000, somente o ano passado conseguiu exercer o seu papel na gestão participativa das águas no estado do Ceará. Para Andrade "o maior desafio do Comitê é sobreviver e exercer suas prerrogativas. A idéia de participação ainda está muito presa aos interesses pessoais e será preciso criar uma cultura do coletivo", e conclui: "isso leva tempo".

Atualizado em 15/02/05
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