Variedades
de algodão são aprovadas às pressas
Nesta
quinta-feira, o presidente Lula sancionou a Lei de Biossegurança
e manteve os poderes da Comissão Técnica Nacional
de Biossegurança (CTNBio). A lei permite o plantio e comercialização
de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs), bastando para
isso a aprovação da variedade transgênica
pela CTNBio, órgão ligado ao Ministério de
Ciência e Tecnologia (MCT). O Ministério do Meio
Ambiente (MMA), ao qual, pelo projeto aprovado no Congresso no
dia 2 de março não cabe parecer sobre a segurança
ambiental, trabalhou junto ao presidente por vetos mas perdeu
mais uma vez. O veto restituiria o poder de decisão ao
MMA e seria uma compensação oferecida à ministra
Marina Silva, quem vêm acumulando derrotas em embates contra
outros setores do governo, principalmente o Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). De tão
desgastada politicamente, a sobrevivência da ministra à
reforma ministerial chegou a surpreender alguns.
Nesta
última semana, a CTNBio já trabalhava intensamente.
O objetivo, segundo declarou o próprio coordenador da Comissão
ao jornal Valor Econômico, era agilizar antigos pedidos
de parecer que poderiam atravancar os trabalhos da CTNBio. O coordenador
prevê um alto fluxo de pedidos nos próximos meses.
"A CTNBio não quer deixar processos em
aberto, sem saber quando eles poderiam ser avaliados após
a sanção da lei", declarou.
A
"pressa" da CTNBio foi tão grande que o MMA chegou
a sonhar com um veto presidencial a seus plenos poderes. Apenas
em um dia de trabalho, no último dia 22, a Comissão
avaliou onze pedidos de liberação de organismos
geneticamente modificados, incluindo variedades de milho e arroz
das transnacionais Monsanto, Bayer e Syngenta. Na mesma sessão
foi aprovada a importação de 370 mil toneladas de
milho transgênico vindo da Argentina, decisão que
teve voto contrário a do representante do MMA que classificou
o parecer positivo como "leviano".
Contudo,
foi na semana passada, no dia 17, que aconteceu a decisão
da CTNBio, que mais parece ter incomodado o governo. Em decisão,
cuja relevância só pode ser comparada à de
liberar o plantio e comercialização de soja transgênica,
em 1998 - e que resultou em processo judicial que se arrasta até
hoje -, a CTNBio liberou o plantio do chamado "algodão-veneno
da Monsanto", o Bollgard. A variedade é uma mistura
genética e contém genes de uma bactéria que
funciona como um inseticida contra pragas que atacam o algodão.
O afã na aprovação tem sido usado como exemplo
dos critérios pouco rígidos da Comissão e
de sua vontade de agradar aos interesses das empresas.
Contrário
à aprovação, o MMA divulgou nota em que afirmou
que "a decisão foi tomada sem avaliação
de risco ambiental em condições brasileiras e com
base em estudos científicos de baixa qualidade, muitos
ainda não publicados; portanto, sem o crivo da comunidade
científica". A nota afirma ainda que a decisão
"põe em risco a proteção ambiental do
país e a qualidade de vida das presentes e futuras gerações".
Para Rubens Nodari, representante do MMA na CTNBio e único
voto contrário frente a nove favoráveis, a decisão
foi política. "Ao que tudo indica a decisão
já estava tomada antes mesmo da reunião, cuja pauta
foi alterada para dar prioridade ao processo de liberação
comercial do algodão Bollgard", declarou.
Segundo
ele, se os atuais membros da CTNBio não têm envolvimento
direto com as empresa no mínimo sofrem de conflitos de
interesse. "Vejamos, quatro dos membros atuais são
conselheiros do Conselho de Informações sobre Biotecnologia
(CIB), entidade mantida pelas empresas multinacionais de biotecnologia
diretamente interessadas na liberação dos transgênicos.
Metade dos membros da comunidade científica trabalha diretamente
com biotecnologia e quatro em programas de melhoramento genético",
acusa.
O
presidente da CTNBio, Jorge Guimarães, tem respondido às
acusações com ataques, dirigidos especialmente ao
MMA. De acordo com Guimarães, a "CTNBio tem gente
do mais alto padrão. Não sei se outros órgãos
do governo têm a mesma competência. Órgãos
que deviam cuidar das queimadas têm se metido em assuntos
que precisam de muito mais competência científica".
Resultados
ruins para os OGMs
As liberações apressadas no Brasil estão
acontecendo ao mesmo tempo em que importantes estudos atestando
a nocividade ao meio ambiente dos transgênicos são
publicados no exterior. No último dia 22, foi divulgado
um dos maiores e mais amplos trabalhos sobre o assunto. Foram
analisadas a interação com o meio ambiente de duas
variedades de colza, uma de milho e uma de beterraba em plantações
transgênicas britânicas e, destes experimentos, três
se mostraram prejudiciais à biodiversidade. O único
que livrou a pele dos OGMs foi considerado com falhas. O estudo
comparativo entre plantações convencionais e transgênicas
deverá ser publicado em periódico da Royal Society
britânica. De acordo com os pesquisadores, o impacto não
se deve propriamente às plantas transgênicas mas
aos herbicidas que nela devem ser aplicados, responsáveis
pela eliminação das plantas concorrentes que ficam
ao redor das modificadas. É o mesmo procedimento de controle
de pragas adotado para a soja transgênica no Brasil.