Dieta enriquecida promove produção de leite com
menor teor de gordura
Um
leite mais rico em proteína, com menos gordura e com propriedades
anticancerígenas pode chegar ao mercado em breve. A novidade
faz parte de uma pesquisa desenvolvida por cientistas do Departamento
de Zootecnia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP),
da Embrapa Gado de Corte, da Universidade de Idaho e da Universidade
de Cornell, ambas dos EUA. O estudo provou que, com a adição
de ácido linoléico conjugado (CLA) na ração
dos animais leiteiros, é possível produzir um leite
com teor de gordura intermediário entre o semi-desnatado
e o integral, e com propriedades anticancerígenas, que potencialmente
não só previnem mas também atacam as células
tumoriais já presentes no organismo, reduzindo tumores, como
foi constatado em cobaias e culturas de células.
Além da melhor qualidade do leite, a ração
com CLA pode aumentar a quantidade de leite produzida pelos animais.
"Os trabalhos pioneiros de redução de gordura
do leite com o uso de CLA foram feitos na Universidade de Cornell
pela equipe de Dale Bauman. Na verdade, o objetivo inicial era apenas
aumentar o conteúdo de CLA no leite em função
do suas propriedades nutracêuticas. Como a redução
[de gordura] foi bastante drástica, foi fácil perceber
que os animais que recebiam o CLA [na ração] produziam
menos gordura, pois visualmente havia menos nata naquelas amostras",
explica Sérgio Raposo de Medeiros, pesquisador da Embrapa
Gado de Corte, que desenvolveu sua tese de doutorado sobre o assunto,
com orientação de Dante Pazzanese Lanna, coordenador
do Laboratório de Nutrição e Crescimento Animal
da Esalq.
A maior produção de leite pode ser explicada pela
capacidade do composto inibir o processo de síntese de gordura
no organismo do animal - tanto no tecido adiposo, quanto na glândula
mamária. "A maior parte da energia secretada no leite
está na gordura. Quando a quantidade de gordura por litro
de leite diminui, temos menos energia por litro produzido",
diz Medeiros. O pesquisador esclarece que, quando há redução
no teor de gordura, pode ocorrer dois processos: o animal não
reduz o consumo de alimento ingerido e a energia a mais se transforma
em mais litros de leite, ou o animal produz a mesma quantidade de
leite, mas reduz o consumo ingerindo (equivalente à economia
de energia), como no caso dos animais estudados pela USP/Embrapa
e que receberam a dieta com CLA.
O
CLA é um ácido graxo, encontrado em maiores
quantidades na gordura de animais ruminantes, como bovinos,
ovinos e caprinos. É um composto natural, existente
em diferentes formas de acordo com o arranjo de suas moléculas,
que está presente em diversos alimentos de origem animal.
Por causa de suas características - propriedade repartidora
de nutrientes e atividade anti-carcinogênica -, o interesse
por esse composto tem crescido nos últimos anos.
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A
pesquisa brasileira também conseguiu mostrar, pela primeira
vez, os efeitos, diretos ou indiretos, do uso de CLA na melhoria
do desempenho reprodutivo dos animais. "No nosso estudo, o
tempo médio do dia do parto até a confirmação
da próxima prenhez (conhecido como período de serviço)
foi 50 dias mais curto para o grupo de animais que recebeu CLA,
em relação aos animais que não receberam",
explicou o pesquisador pontuando que assim o animal já estaria
disponível para uma nova gravidez.
Produção de CLA
A fabricação do Ácido Linoléico Conjugado
é bastante simples, informa o pesquisador da Esalq. A matéria
prima utilizada é gordura vegetal que é processada
a partir de um processo semelhante ao usado para produzir margarina
(biohidrogenação). De acordo com Medeiros apenas algumas
formas da molécula de CLA são responsáveis
pela redução da gordura do leite. A discussão
atual é sobre quais seriam elas e qual a ordem de efetividade
delas. "Nesta forma, contudo, o CLA seria quase que totalmente
transformado no rúmen em formas não ativas, transformando-se
em ácidos graxos saturados.
O novo tipo de leite passará ainda por uma série de
estudos com o objetivo de comprovar suas propriedades e segurança.
"Há grande apelo no mercado para produtos que façam
bem à saúde e um leite com menor teor de gordura,
maior teor de um ácido graxo com propriedades nutracêuticas,
menor teor de ácidos graxos menos saudáveis e com
maior teor de proteína está bem alinhado com esse
anseios do consumidor", acredita.
Embora o custo desse leite possa sofrer um acréscimo por
causa da suplementação de CLA, o pesquisador acredita
que a maior produção de leite e melhor desempenho
reprodutivo poderão compensar. "Todavia, mesmo que o
custo seja igual, é provável que os produtores - fazendeiros
e indústria - queiram aproveitar o fato do produto ser diferenciado
e cobrar mais por isso", avalia.
Uma linha bastante atual de pesquisa, segundo o pesquisador Lanna,
é fazer com que os animais produzam o CLA pelas próprias
bactérias que vivem no seu trato gastro-intestinal. "Pesquisas
neste sentido têm procurado fornecer ao animal diferentes
tipos de óleos que contenham o ácido linoléico,
permitindo que este seja transformado em ácido linoléico
conjugado (CLA)", diz. O trabalho na USP envolve compreender
quais bactérias do trato digestivo são responsáveis
pela transformação e quais as condições
para maximizar este processo.