Registro da marca cupuaçu é anulado no Japão
O
nome da fruta cupuaçu, registrado como marca comercial exclusiva
pela multinacional Asahi Foods, volta a ser reconhecido como
de domínio popular. O Escritório de Marcas e Patentes
do Japão (JPO) anulou no início de março o
registro (concedido em 1998) e nesta semana venceu o prazo para
recorrer da decisão.
O
cancelamento do registro é resultado da campanha de pressão
"O cupuaçu é nosso" (que a ComCiência
acompanhou), liderada pela organização acreana Amazonlink
e pelo Grupo de Trabalho Amazônico (GTA, entidade que representa
mais de 500 ONGs), em parceria com outras entidades governamentais
e não governamentais. As duas entidades comemoraram a anulação
no dia 8 de março em Rio Branco (AC), com um show de bandas
musicais, e em Manaus no dia 10. Agora, estão planejando
as próximas etapas da campanha, voltadas para a anulação
do registro do cupuaçu na Europa e nos Estados Unidos e para
sensibilizar a opinião pública sobre outros casos
de patenteamento ou registro ilegítimo.
Os
argumentos da ação de cancelamento do registro do
cupuaçu, protocolada em março do ano passado, foram
aceitos integralmente pelo JPO. O artigo 3 da lei de marcas do Japão
afirma que uma marca não pode ser registrada caso ela indique
um nome já comum de matérias primas, o que impede
a propriedade exclusiva do nome da fruta. Além disso, o escritório
reconheceu que o nome exclusivo como marca pudesse ser usado até
para indicar óleos e gorduras comestíveis que não
fossem extraídos do verdadeiro cupuaçu, lesando os
consumidores. O Japão negou também o pedido de patente
do processo de extração do óleo da semente
do cupuaçu, que faz o cupulate, um chocolate de cupuaçu:
a Embrapa já patenteou esse mesmo processo em 1990, mesmo
com patente válida somente no território nacional.
"É
uma vitória significativa", - comenta Michael Schmidlehner,
presidente da Amazonlink - "porque abre um precedente: se foi
anulado o registro de uma empresa japonesa no Japão, confiamos
que outros registros, na Europa e nos Estados Unidos, também
sejam negados". O registro do cupuaçu chegou ao conhecimento
da opinião pública brasileira somente em 2002, quando,
ao enviar algumas amostras de cupuaçu para a Alemanha para
avaliar possibilidades de comercialização, foi descoberto
que o nome da fruta estava registrado como marca nos EUA, Europa
e Japão e que o processo de produção do cupulate
estava sendo patenteado.
"No
nível simbólico" - explica Schmidlehner - "esta
anulação representa um passo importante porque demonstra
que a sociedade civil pode exercer pressão e obter que sejam
tomadas providências efetivas contra registros e patentes
ilegítimas. A campanha serviu também para que muitas
pessoas tomassem conhecimento da existência desses registros
e fossem sensibilizadas sobre o assunto da biopirataria. Mas temos
ainda muito caminho a fazer".
O governo brasileiro está promovendo, de acordo com informações
do presidente da Amazonlink, uma ação oficial para
pedir a anulação do registro na Oficina de Armonizacion
del Mercado Interior (Oami), o escritório de registros
da União Européia. Segundo ele, já foi enviado
ao Itamaraty uma documentação que será útil
para anular o registro do cupuaçu nos Estados Unidos e na
Europa. Há ainda outra ação no Escritório
Europeu de Patentes para pedir a anulação da patente
sobre o processo de produção do cupulate. "Pretendemos
demonstrar a ilegitimidade da patente, por duas razões: existe
um processo tradicional de produção do cupulate e
a Embrapa já patenteou no Brasil os processos industriais
de extração de óleos a partir do cupuaçu.
Nos Estados Unidos foi registrada a mesma marca e pedida a patente.
Em parceria com o GTA, estamos avaliando como agir", conclui
Schmidlehner.
A
Amazonlink lança nesta semana uma nova versão do site
sobre biopirataria
que contém dossiês de documentação sobre
uma dúzia de outros exemplos de biopirataria ou registro
ilegítimo de marcas. Envolvem casos conhecidos (como o da
unha de gato, celebre planta medicinal e da ayahuasca) e outros
menos famosos, como o do biribiri (Octotea radioei), que
é uma planta amazônica de uso tradicional entre os
Wapixana de Roraima, que contém uma substância patenteada
por uma empresa canadense.