Sistema modular pode aumentar produtividade da maricultura brasileira
Pesquisadores
da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desenvolveram um
sistema modular de equipamentos capaz de aumentar a produtividade
nacional de frutos-do-mar. O conjunto representa a mecanização
de quatro das oito etapas do cultivo de ostras e mexilhões.
Além do potencial lucrativo, o sistema poderá melhorar
as condições de trabalho dos criadores, que atualmente
exercem as atividades de forma artesanal.
O
protótipo, idealizado pelo Núcleo de Desenvolvimento
Integrado de Produtos (Nedip), em parceria com o Laboratório
de Moluscos Marinhos da UFSC e a Empresa de Pesquisa Agropecuária
e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), foi construído
por técnicos do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
(Senai) de Florianópolis. Cada unidade é constituída
por peças que executam a desgranação (separação
das conchas, que ao serem retiradas da água estão
unidas em blocos), a limpeza (retirada de outros animais e plantas
aquáticos), a seleção dos mexilhões
ou das ostras de acordo com seu tamanho, e a limpeza refinada (extração
do limo e de outras impurezas, por meio de escovação).
"O
módulo processa cerca de duas toneladas de produto por hora.
No método tradicional, são processados aproximadamente
40 kg por hora, o que equivale a uma corda de três metros
com mexilhões", afirma Fernando Forcellini, pesquisador
do Nedip, que estima o custo de cada sistema modular em torno de
R$ 2 mil.
Numa
próxima fase, os pesquisadores pretendem automatizar as demais
etapas, que são o encordoamento dos mexilhões (colocação
das larvas em uma corda, onde são cultivadas), o içamento
da corda onde se fixam os mexilhões ou dos cestos onde são
criadas as ostras (chamados "lanternas") e a descarnação
(retirada dos moluscos da concha).
Produção
nacional
Com mais de 7 mil km de costa, o Brasil oferece boas condições
para a maricultura (cultivo no mar). No entanto, sua posição
internacional ainda é modesta. Os principais produtores mundiais,
como China, Espanha e França, utilizam processos completamente
mecanizados, enquanto que no Brasil boa parte do trabalho ainda
é manual.
"Há
um espaço grande para o crescimento da produção
nacional, mas ainda falta um passo tecnológico", comenta
Forcellini. Segundo o pesquisador, a automatização
demorou a acontecer no Brasil porque os equipamentos internacionais
não se adaptam às espécies de ostras e mexilhões
típicas do nosso litoral. "Não adianta importar
as máquinas. É preciso desenvolver uma tecnologia
nacional", explica.
Uma
das incompatibilidades entre o cultivo brasileiro e o espanhol,
por exemplo, está na desgranação. A substância
secretada por moluscos bivalves para fixá-los a rochas, conhecida
como bisso, é mais resistente no mexilhão Perna
perna, espécie criada no Brasil, que no Mytilus edulis,
típico da Espanha. Outro aspecto divergente é a profundidade
em que os mexilhões se desenvolvem. No primeiro caso, a produção
é feita a cerca de 3 metros da superfície, enquanto
na Espanha as cordas são pelo menos cinco vezes maiores.
O investimento em tecnologias próprias para o setor é
um importante passo para a aqüicultura brasileira, hoje voltada
à produção de carpas, tilápias e outros
peixes de água doce. Dados da Organização das
Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO) mostram que em 2001 a produção nacional desses
tipos de pescado foi de 65 mil, 38 mil e 30 mil toneladas, respectivamente.
Na maricultura, os números foram bem mais modestos: a produção
de camarões de pata branca foi de 30 mil toneladas, a de
mexilhões de 14 mil toneladas e a de ostras de 1,4 mil toneladas.
Ao ignorar o cultivo de ostras e mexilhões o país
subestima um mercado que movimenta
US$ 4 bilhões ao ano.
Condições
de trabalho
A mecanização traz a esperança de um trabalho
mais leve e rentável para os maricultores. Uma corda de 3
metros repleta de mexilhões em ponto de colheita pesa em
torno de 40 kg, segundo o engenheiro Aldrwin Hamad, também
no Nedip, que trabalha no desenvolvimento de um sistema de elevação
e manejo embarcado das estruturas desse tipo de cultivo. As lanternas
de ostras, por sua vez, variam de 35 kg a 50 kg.
"Os
esforços repetitivos de cargas elevadas, aliadas ao espaço
restrito de operações nas embarcações
em posições desconfortáveis e anti-ergonômicas,
geram problemas de saúde. Além disso, podem causar
acidentes graves, como tombamento e afundamento da embarcação",
afirma Hamad em seu projeto de dissertação de mestrado.
A
falta de mecanização é o principal motivo da
baixa produtividade das famílias brasileiras dedicadas à
maricultura, a maioria delas de baixo poder aquisitivo. Enquanto
na Espanha a produção por família gira em torno
de 80 toneladas por ano, no Brasil é de aproximadamente 12
toneladas por ano.
A
produção começou a evoluir do extrativismo
para a produção comercial na década de 60.
No fim dos anos 80, a UFSC começou a pesquisar novas tecnologias
de cultivo de mexilhões para as comunidades próximas
a Florianópolis. Atualmente, Santa Catarina detém
90% da produção nacional de moluscos marinhos.
Em
1995, a produção nacional de mexilhões era
de 3 mil toneladas. Em seis anos, esse número chegou a 14
mil toneladas. O país alcançou o 12o lugar no ranking
mundial. Os primeiros colocados são a China, com 568 mil
toneladas, Espanha, com 246 mil, e a Tailândia, com 89 mil
toneladas.