Células a combustível levam eletricidade a comunidades
isoladas na Amazônia
Sustentabilidade
econômica, social e ambiental em um ponto isolado da Amazônia
é o foco do projeto Célula Combustível (Celcomb),
que implantará um sistema de fornecimento de energia elétrica
em Arixi, município de Anamã (AM), composto por reformador
de gás natural, purificador de hidrogênio e uma célula
combustível de 5 kW. É tecnologia de ponta levada
a uma região distante, de perfil oposto aos centros urbanos,
onde até então as células a combustível
vêm sendo cogitadas para aplicação em todo o
mundo. Com recursos do Fundo Setorial de Energia e do Ministério
de Minas e Energia, no valor de R$ 465 mil, a Unicamp será
parceira da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) para o desenvolvimento
e implantação do projeto, com início em abril
e término em dois anos.
"O
custo desta tecnologia é inicialmente maior que o de sistemas
tradicionais, mas com seu desenvolvimento pode passar a ser menor.
As maiores vantagens são ambientais, por ser um sistema limpo,
onde será emitido menos Co2 [gás carbônico]
que os motores a diesel e será utilizado um recurso local
que é o gás natural", explica Ennio Peres da
Silva, responsável na Unicamp pelo projeto e coordenador
do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético
(Nipe) e do Laboratório de Hidrogênio do Instituto
de Física.
Ainda
no início da implantação comercial em todo
o mundo, a tecnologia de célula a combustível tem
se mostrado promissora e com potencial de redução
de custos. Segundo o pesquisador, outro ponto favorável para
a implantação do sistema naquela região é
a localização de Anamã, que fica entre as cidades
de Manaus e Coari, de onde sai o gasoduto que leva gás natural
até a capital. Isso quer dizer que a comunidade dispõe
do gás necessário para a geração de
energia pelo sistema proposto. Somente as células serão
produto importado.
O
projeto apresentado pelas duas universidades teve origem em um edital
lançado pelo governo federal. A coordenação
será responsabilidade da Ufam, que faz parceria com a Unicamp
por intermédio do Nipe e do Núcleo de Estudos e Pesquisas
Ambientais (Nepam). O trabalho conta ainda com o apoio do Centro
Nacional de Referência em Energia do Hidrogênio (Ceneh),
localizado dentro dessa mesma universidade.
A
avaliação das características energéticas
locais e levantamento das demandas será realizada em um ano,
para depois ocorrer implantação e instalação
da máquina. O Nepam será responsável pela análise
sócio-econômica e ambiental da localidade beneficiada,
antes e após a implantação, além da
verificação das condições de vida da
população com a chegada da energia. "Nossa preocupação
será com os impactos nestas áreas de ambiente e sociedade,
por isso vamos ouvir as expectativas da população,
porque é ela que pode sofrer mudanças de hábitos
a partir de uma nova forma de energia", afirma Lúcia
da Costa Ferreira, coordenadora do Nepam. De acordo com ela, a idéia
é estimular a introdução da energia elétrica
em equipamentos coletivos, como televisão, rádio e
máquinas de farinha, para promover organização
da comunidade e evitar muitos pontos de energia no local.
A
expectativa dos pesquisadores é que, com o sucesso do projeto,
o sistema seja levado a várias comunidades isoladas não-indígenas
que vivem na Amazônia e que sofrem com a falta de energia
em função do difícil acesso, da baixa demanda
de energia elétrica e do baixo poder aquisitivo. Por isso,
a característica local é o atendimento energético
por sistemas isolados. As concessionárias responsáveis
pelo fornecimento de energia se deparam ainda com grandes distâncias,
preocupações ambientais, custos altos de implantação
e manutenção e limitações físicas
como a impossibilidade de fiação aérea. Repassar
os custos reais implicaria em tarifas altíssimas para o consumidor.
Por isso, o governo fornece subsídio, que é rateado
nacionalmente. As soluções alternativas, portanto,
são de grande importância.
O
projeto Celcomb vem ao encontro das metas lançadas pelo Governo
Federal este ano com o programa Luz para Todos, orçado em
R$ 7 bilhões. O objetivo é levar energia elétrica
para mais de 12 milhões de pessoas até 2008. Coordenado
pelo Ministério de Minas e Energia, o programa contempla
como opções tecnológicas a extensão
de rede, os sistemas de geração descentralizada com
redes isoladas ou sistemas de geração individuais.
O
uso de fontes energéticas locais, como o gás natural,
tem se mostrado um dos caminhos mais viáveis, diz Ennio da
Silva. "É necessário um sistema de pouca manutenção,
porque a quebra de uma pequena peça em um motor a diesel
pode representar meses de falta de energia, em função
do transporte precário", esclarece. O acesso a Anamã,
cidade com cerca de 7 mil habitantes, por exemplo, é totalmente
feito por barcos. A proposta prevê um sistema sem partes móveis
e de pouco desgaste, que minimize a manutenção e o
fornecimento descontínuo e sem qualidade.
A
iniciativa será uma demonstração técnica
do sistema reformador-purificador-célula a combustível.
De acordo com os coordenadores, o sucesso do projeto será
importante para o desenvolvimento da tecnologia das células
a combustível para uso de sistemas isolados, abrirá
novos mercados para este sistema energético e promoverá
atividades produtivas que permitam geração local de
empregos. Depois de dois anos, a manutenção será
feita pela comunidade com formação técnica,
com apoio da Ufam e acompanhamento da Unicamp.
O
equipamento, desenhado pela Unicamp, deverá ter 1,5 metro
de altura, um metro de largura e 1,5 de comprimento. O reformador
é uma espécie de reator onde entra gás natural
e sai hidrogênio. O hidrogênio atua no módulo
da célula combustível junto com o ar e produz energia
elétrica e água.