Crédito rural será ampliado pagando-se menos juros
O Programa Nacional de Apoio à Agricultura Familiar - Pronaf
- disponibilizou, de julho a dezembro de 2003, R$ 2,8 bilhões,
valor superior ao do ano de 2002 inteiro, que era de R$ 2,2 bi.
Este aumento pode ser atribuído a um conjunto de esforços
do governo, que contou com informações sobre os principais
motivos da baixa aplicação dos recursos e dos altos
custos do crédito rural no Brasil. Em sua pesquisa de mestrado,
Gilson Alceu Bittencourt, atual assessor do Ministro da Fazenda
para crédito rural, constatou que, em alguns casos, o governo
chegava a gastar 40% entre equalização de juros, subsídios
diretos nos financiamentos e no pagamento de spread
e taxas bancárias. Na dissertação, ele sugere
uma série de medidas, algumas já em implementação,
para diminuir os gastos, corrigir distorções regionais
e econômicas e ampliar o acesso ao crédito, principalmente
entre os agricultores familiares de menor renda.
A
pesquisa revelou que os grandes financiamentos rurais também
tinham alto custo e que, apesar das taxas bancárias serem
proporcionalmente menores, o valor total do subsídio do governo
acabava sendo maior para os mais ricos do que para os agricultores
familiares. Outro problema identificado é que os recursos
disponíveis para o crédito são muito segmentados
por fonte, modalidade e região, "com isso, acabava havendo
excedente de recursos para uma modalidade de crédito ou região
e faltavam recursos em outras modalidades ou regiões, os
quais não podiam ser realocados", explica Bittencourt.
Segundo ele, ao contrário do que muitos pensavam, o principal
problema para a baixa aplicação do crédito
do Pronaf em relação ao volume total disponibilizado
não é a falta de garantia de pagamento por parte dos
agricultores. Os principais problemas seriam, segundo ele, a falta
de mais recursos equalizados, com pagamento de spreads bancários
mais elevados, principalmente para crédito de custeio e a
composição das fontes dos recursos disponibilizados.
Bittencourt
conta que a idéia inicial de seu mestrado era estudar o funcionamento
de pequenas cooperativas de crédito de agricultores familiares.
Porém, no segundo ano ele assumiu a Secretaria de Agricultura
Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário
com o objetivo de fazer com que mais créditos chegassem aos
agricultores. Foi quando constatou os altos custos do governo, as
dificuldades para sua aplicação e a falta de informações
sobre como era composta a planilha de custos públicos para
os financiamento. Na volta ao mestrado, aproveitou a vivência
no governo para ampliar seus objetivos. "Tive acesso a dados
públicos que não haviam sido sistematizados e eram
desconhecidos até por pessoas do próprio governo envolvidas
com o tema, e que não conheciam as fórmulas e cálculos
envolvidos", conta o atual assessor.
Alguns
dos principais desafios para o Pronaf são, na opinião
de Bittencourt, "ampliar o número de beneficiários,
especialmente entre os mais pobres, reduzir os custos per
capita dos financiamentos e garantir melhor qualidade nos
projetos financiados, para que eles possam realmente ampliar a renda
dos agricultores". Nesse sentido, uma mudança importante
sugerida por ele é a tentativa de reduzir os subsídios
dados ao segmento patronal para aumentar o subsídio dos agricultores
familiares. A mudança está em implementação.
Após
a apresentação dos resultados da pesquisa o governo
alterou a composição de algumas das fontes de financiamento,
adotando fontes mais baratas, e passou a cobrar uma revisão
dos valores cobrados pelos bancos públicos nas operações
de crédito rural. Além disso, intensificaram-se as
discussões sobre os custos do crédito rural nos ministérios
do Desenvolvimento Agrário (MDA) e da Agricultura (MAPA),
que passaram a entender melhor seus custos. "Em 2003, já
ocorreu uma significativa redução nos custos per
capita dos financiamentos rurais em função do
debate destas questões no interior do governo, com a aplicação
de algumas das propostas apontadas na dissertação",
conta Bittencourt.
As
ações postas em prática
Em 2003, os gastos do governo federal com os financiamentos do Pronaf
aumentaram em relação a 2002. Porém, como parte
das fontes dos recursos foram alteradas, as taxas pagas pelo governo
aos bancos públicos diminuiram e a exigência de documentos
e o custo per capita nestes financiamentos foram reduzidos.
Parte dos financiamentos para os segmentos mais pobres contam com
recursos do Orçamento Geral da União, facilitando
a sua aplicação porque o risco é parcial ou
total da União. Além disso, as modalidades de crédito
estão melhor distribuídas, facilitando o atendimento
das reais demandas dos agricultores, provocando um aumento do número
de agricultores com acesso ao crédito. O atual governo também
busca outros mecanismos de apoio ao agricultor, como a compra antecipada
da produção, ampliação de recursos do
tesouro para garantias de pagamento, apoio a constituição
de fundos de aval para os segmentos mais pobres dos agricultores
e ampliação dos financiamentos para a agricultura
familiar com recursos dos depósitos a vista, ação
que poderá reduzir ainda mais os custos para o governo. Outras
ações sugeridas e em implementação são
o incentivo aos bancos cooperativos e cooperativas de créditos
independentes de agricultores familiares para que operem o crédito
rural.
A
pesquisa, realizada no Núcleo de Economia Agrícola
do Instituto de Economia da Unicamp sob a orientação
do professor Antônio Márcio Buainain, resultou na dissertação:
Abrindo a Caixa Preta: O financiamento da agricultura familiar
no Brasil - e contou com o financiamento da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp.
Spread
= Margem bancária adicionada à taxa aplicável
a um crédito, o spread é variável conforme
a liquidez e as garantias do tomador, o volume do empréstimo
e o prazo de resgate.