Dominação cultural cria máquinas como vilões
nas ficções científicas
As distopias - antônimo do país descrito no livro Utopia
de Thomas Morus - presentes nos livros e filmes de ficção
científica que apresentam a luta de homens contra máquinas
vilanizadas, precisam ser entendidas tendo-se em vista as relações
de dominação de gênero e da cultura ocidental
sobre as outras. Esse é o argumento defendido pela filósofa
norte-amerciana, Maureen Linker, professora da Universidade de Michigan-Deaborn
e expresso no artigo Why should ideal reasoners become evil computes?
(Porque racionalistas ideais se tornam computadores do mal?), publicado
no último número da revista científica Science
as Culture.
Para
Maureen, entender os computadores que se voltam contra os homens
nas obras de ficção como expressão de uma tecnofobia
é muito pouco. O que está em jogo nessas obras da
cultura popular é, na verdade, uma prática de expiação
da culpa da racionalidade ocidental. As obras colocam os computadores
como o lugar da racionalidade extrema, da pura lógica, enquanto
os homens são oprimidos pelas máquinas, assumindo
o papel de vítimas inocentes. "Para ser inocente alguém
precisa ser culpado, uma lei natural que leva os grupos sociais
a forjarem sua inocência nas costas dos outros", acrescenta,
citando a analista cultural Shelby Steele.
A
filósofa aproveita, ainda, para questionar a existência
de uma razão universal, que não seja derivada de uma
visão originada de uma cultura em particular. Ela cita o
Cyc, um dos maiores
experimentos em inteligência artificial realizados atualmente.
O Cyc - a palavra é uma abreviação para encyclopedia
- é um projeto que se dedica a reunir a maior parte do senso
comum produzido pela humanidade. "Esse sistema ignora as diferenças
políticas e sociais e o papel do poder na aferição
do que é o senso comum. Ao invés disso, os pesquisadores
estão procurando por um conjunto de verdades generalizadas
que sejam universais e obviamente racionais", afirma Maureen.
Os criadores do Cyc estariam inserindo o que é tomado como
verdade pela cultura ocidental e atribuindo as respostas da máquina
a uma racionalidade neutra.
"Esse
projeto tem pouca relação com o cuidado e a preocupação
com a experiência humana particular e, como resultado, a 'inteligência'
é construída do ponto de vista de um ser isolado consciente
resolvendo problemas altamente específicos buscando derrotar
adversários potenciais", diz. Para criticar o projeto,
ela baseou-se em declarações dos próprios pesquisadores
que afirmaram que, se conseguissem fazer com que a máquina
fosse capaz de deduzir teoremas e jogar xadrez ela seria inteligente.
"Para esses pesquisadores, 'saber que...' vem antes de 'saber
como'. A inteligência está condenada a ser a capacidade
de dedução racional e o desenvolvimento de estratégias
simbólicas", conclui.