Queimadas afetam a chuva na Amazônia
As
queimadas na floresta Amazônica alteram o mecanismo de chuvas
da floresta. Quando uma parcela de floresta ou pasto é queimada,
grande quantidade de partículas de aerossóis (partículas
sólidas ou líquidas em suspensão em um gás)
são emitidas para a atmosfera, e os mecanismos de formação
de nuvens são fortemente alterados, podendo estender o período
seco da região.
O
número de núcleos de condensação de
nuvens passa de cerca de 300 partículas por cada centímetro
cúbico para mais de 5 mil partículas por centímetro
cúbico, o que significa um aumento de quase 17 vezes. Com
isso, o tamanho de cada gotícula das nuvens diminui significativamente,
de 25 a 30 mícron para menos de 10 mícron (1 mícron
equivale a milésima parte do centímetro), resultando
em gotas tão pequenas que não precipitam. Estas gotas
também contêm quantidades significativas de carbono
grafítico (a fuligem emitida pelo cano de descarga de ônibus
a diesel), que absorvem a radiação solar de modo eficiente.
A radiação solar absorvida aquece a gotícula
e favorece sua evaporação, inibindo, mais uma vez,
a chuva. Com o diâmetro menor, as gotículas são
levadas pelas correntes de ar ascendente para alturas elevadas,
onde são transportadas para locais longe das emissões.
Isso pode aumentar a possibilidade das nuvens atingirem a última
camada da atmosfera terrestre, onde os impactos climáticos
são muito sensíveis e pode inclusive afetar o clima
global. Quando a chuva ocorre nessa altura, geralmente há
uma tempestade forte, o que pode causar danos às copas das
árvores.
O
resultado final é o desaparecimento da chuva na Amazônia,
para nuvens abaixo de 6 quilômetros de altura, que poderia
prolongar a estação seca na Amazônia em até
duas semanas. Consequentemente, mais focos de incêndio seriam
deflagrados, estendendo o período das queimadas e realimentando
o ciclo.
Os
experimentos foram realizados em Rondônia, com forte impacto
de emissões de queimadas, e no Acre. Dois aviões Bandeirantes,
pertencentes ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)
e à Universidade Estadual do Ceará, foram utilizados
para as medidas de partículas de aerossóis e de gotículas
de nuvens. Um deles voava dentro das nuvens, enquanto o outro media
as propriedades físicas e químicas das partículas
de aerossóis que estavam formando as gotículas.
O
estudo, publicado na revista Science
de 27 de fevereiro, faz parte do Experimento de Grande Escala da
Biosfera-Atmosfera da Amazônia (LBA), coordenado por Meinrat
O. Andreae, do Instituto Max Planck da Alemanha, e contou com a
participação de Paulo Artaxo, do Instituto de Física
da Universidade de São Paulo, de Maria Assunção
Faus da Silva Dias e Karla Longo, do Inpe, e de Alexandre Costa
da UECE.
De
acordo com Artaxo, a pesquisa ilustra um efeito das emissões
de queimadas que não havia ainda sido explorado, pois aponta
para mudanças significativas no funcionamento do ecossistema
amazônico como decorrência das queimadas, além
dos efeitos já conhecidos. "O conjunto destes efeitos
leva a alterações importantes na ciclagem de água
pelo ecossistema, no aumento da carga de poluentes atmosféricos
e na dinâmica da circulação regional e global",
pontua.
O
Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia
é uma iniciativa internacional liderada pelo Brasil, cujo
objetivo é entender o funcionamento climatológico,
ecológico, biogeoquímico e hidrológico da Amazônia,
o impacto das mudanças no uso da terra nesses funcionamentos
e as interações entre este ecossistema e o sistema
biogeofísico global da terra.