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Entrevistas
Filósofo,
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Garcia-Roza
Stefan Zweig
Alberto Dines
Psicanálise:
infância e desenvolvimento
Amélia Vasconcellos
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Educação
e Desenvolvimento Infantil
A
Dr. Amélia Thereza de Moura Vasconcellos é psquiatra e psicanalista
especializada em crianças e adolescentes. É a diretora do
IPPIA (Instituto de Psiquiatria e Psicoterapia de Crianças e Adolescentes).
Aqui ela responde a três perguntas formuladas pela Com Ciência
sobre determinações genéticas, violência urbana
e a influência da televisão no desenvolvimento infantil.
Com
Ciência - As recentes pesquisas no campo da genética e da medicina
caminham no sentido de afirmar determinações biológicas para o comportamento
dos sujeitos. Como a psicanálise responde a essa questão?
Vasconcellos - Determinações
genéticas
sempre existem no comportamento e são consideradas pela psicanálise como
fundantes do temperamento do indivíduo. Entretanto, é importante salientar
que o ser humano não se reduz apenas ao biológico, pois na formação da
personalidade existem interferências ambientais, tanto familiares, como
culturais, ecológicas e religiosas, que determinam o caráter do indivíduo.
Com
Ciência - O Dr. Dráuzio Varella publicou um artigo recentemente
no jornal A Gazeta Mercantil, em que trata a violência urbana como
uma doença, em parte com fundo biológico. Essa é uma visão adequada para
a psicanálise?
Vasconcellos - Dr. Draúzio Varella sabiamente colocou em seu artigo
que a violência urbana depende em parte (o grifo é meu) do biológico.
Dada a complexidade do ser humano, como exposto acima, não se pode assumir
uma posição reducionista considerando apenas um fator como determinante
do comportamento. A personalidade se estrutura a partir de diversos fatores,
tanto genéticos quanto ambientais, e é evidente que condições adversas
e frustrações na vida, não elaboradas emocionalmente, podem expressar-se
através da violência, em maior ou menor grau, dependendo da impulsividade
constitucional e da capacidade de contenção dos instintos primitivos
adquirida pela educação. A impulsividade pode ser exacerbada pela permissívidade
e ausência de limites no processo educativo ou pelo excesso de frustração
na vida do sujeito, bem como por outros fatores, sendo um dos mais freqüentes
o alcoolismo e o abuso de outros agentes químicos que interferem no metabolismo
cerebral.
Com
Ciência - Nos últimos 50 anos, a televisão tornou-se um objeto cada
vez mais presente na vida e na educação das crianças. Como ela tem influenciado
no desenvolvimento infantil?
Vasconcellos - A televisão é um excelente veículo informativo com
intenso poder de penetração, tendo grande influência e força junto à opinião
pública, sendo também um ótimo instrumento educacional. Em relação à criança,
que é um ser extremamente vulnerável, estando em pleno processo de estruturação,
desenvolvimento e maturação de sua personalidade, a exposição aos programas
televisivos deve ser feita de maneira criteriosa. Quanto mais jovem for
a criança, mais suscetível à incorporação das cenas que assiste, pois
sua aprendizagem inicial se faz fundamentalmente através da imitação do
que vê. Dependendo da idade e de sua sensibilidade, o excesso de estímulos
que não consegue processar determina uma reação defensiva de enquistamento
autístico, com desligamento do contato com a realidade. A criança muito
pequena e imatura ainda não possui capacidade crítica para discriminar
o que é fantasia da realidade objetiva, e para ela tudo que vê são fatos
reais acontecendo no mundo externo. Dra. Raquel Soifer, psicanalista argentina,
publicou em 1981 o livro A criança e a TV, já traduzido para o
português pela Editora Artes Médicas, no qual faz uma excelente análise
sobre o prejuízo causado pela televisão no processo de estruturação da
vida mental, descrevendo dois novos quadros psicopatológicos em Psiquiatria
da Infância e Adolescência: a Telivisite (casos agudos) e a Televisiose
(casos crônicos), recomendando sua proibição para crianças menores de
5-6 anos, época de maior vulnerabilidade, e uso moderado para crianças
maiores, com seletividade e uso criterioso. A experiência motora de contato
real com o mundo externo é muito importante para favorecer o processo
de maturação cerebral e a formação da personalidade do ser humano e sua
Saúde Mental. Está cientificamente comprovado que o peso cerebral do bebê
ao nascer é de 340 g, aumentando para 1150 g por volta do segundo ano
de vida (cerca de 800 g), enquanto que na vida adulta o cérebro pesa em
média 1400 a 1500 g. Este aumento inicial de peso se faz pelo desenvolvimento
da rede dendrítica das células nervosas, a partir da experiência motora,
o que amplia os circuítos sinápticos que são básicos no estabelecimento
de conexões associativas fundamentais no processo de pensar. Isto comprova
o prejuízo que pode ocorrer na estruturação mental de uma criança
ao ficar imobilizada muitas horas de sua vida diante da tela da televisão.
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