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Psicanálise: infância e desenvolvimento
Amélia Vasconcellos

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Educação e Desenvolvimento Infantil

A Dr. Amélia Thereza de Moura Vasconcellos é psquiatra e psicanalista especializada em crianças e adolescentes. É a diretora do IPPIA (Instituto de Psiquiatria e Psicoterapia de Crianças e Adolescentes). Aqui ela responde a três perguntas formuladas pela Com Ciência sobre determinações genéticas, violência urbana e a influência da televisão no desenvolvimento infantil.

Com Ciência - As recentes pesquisas no campo da genética e da medicina caminham no sentido de afirmar determinações biológicas para o comportamento dos sujeitos. Como a psicanálise responde a essa questão?
Vasconcellos -
Determinações genéticas sempre existem no comportamento e são consideradas pela psicanálise como fundantes do temperamento do indivíduo. Entretanto, é importante salientar que o ser humano não se reduz apenas ao biológico, pois na formação da personalidade existem interferências ambientais, tanto familiares, como culturais, ecológicas e religiosas, que determinam o caráter do indivíduo.

Com Ciência - O Dr. Dráuzio Varella publicou um artigo recentemente no jornal A Gazeta Mercantil, em que trata a violência urbana como uma doença, em parte com fundo biológico. Essa é uma visão adequada para a psicanálise?
Vasconcellos - Dr. Draúzio Varella sabiamente colocou em seu artigo que a violência urbana depende em parte (o grifo é meu) do biológico. Dada a complexidade do ser humano, como exposto acima, não se pode assumir uma posição reducionista considerando apenas um fator como determinante do comportamento. A personalidade se estrutura a partir de diversos fatores, tanto genéticos quanto ambientais, e é evidente que condições adversas e frustrações na vida, não elaboradas emocionalmente, podem expressar-se através da violência, em maior ou menor grau, dependendo da impulsividade constitucional e da capacidade de contenção dos instintos primitivos adquirida pela educação. A impulsividade pode ser exacerbada pela permissívidade e ausência de limites no processo educativo ou pelo excesso de frustração na vida do sujeito, bem como por outros fatores, sendo um dos mais freqüentes o alcoolismo e o abuso de outros agentes químicos que interferem no metabolismo cerebral.

Com Ciência - Nos últimos 50 anos, a televisão tornou-se um objeto cada vez mais presente na vida e na educação das crianças. Como ela tem influenciado no desenvolvimento infantil?
Vasconcellos - A televisão é um excelente veículo informativo com intenso poder de penetração, tendo grande influência e força junto à opinião pública, sendo também um ótimo instrumento educacional. Em relação à criança, que é um ser extremamente vulnerável, estando em pleno processo de estruturação, desenvolvimento e maturação de sua personalidade, a exposição aos programas televisivos deve ser feita de maneira criteriosa. Quanto mais jovem for a criança, mais suscetível à incorporação das cenas que assiste, pois sua aprendizagem inicial se faz fundamentalmente através da imitação do que vê. Dependendo da idade e de sua sensibilidade, o excesso de estímulos que não consegue processar determina uma reação defensiva de enquistamento autístico, com desligamento do contato com a realidade. A criança muito pequena e imatura ainda não possui capacidade crítica para discriminar o que é fantasia da realidade objetiva, e para ela tudo que vê são fatos reais acontecendo no mundo externo. Dra. Raquel Soifer, psicanalista argentina, publicou em 1981 o livro A criança e a TV, já traduzido para o português pela Editora Artes Médicas, no qual faz uma excelente análise sobre o prejuízo causado pela televisão no processo de estruturação da vida mental, descrevendo dois novos quadros psicopatológicos em Psiquiatria da Infância e Adolescência: a Telivisite (casos agudos) e a Televisiose (casos crônicos), recomendando sua proibição para crianças menores de 5-6 anos, época de maior vulnerabilidade, e uso moderado para crianças maiores, com seletividade e uso criterioso. A experiência motora de contato real com o mundo externo é muito importante para favorecer o processo de maturação cerebral e a formação da personalidade do ser humano e sua Saúde Mental. Está cientificamente comprovado que o peso cerebral do bebê ao nascer é de 340 g, aumentando para 1150 g por volta do segundo ano de vida (cerca de 800 g), enquanto que na vida adulta o cérebro pesa em média 1400 a 1500 g. Este aumento inicial de peso se faz pelo desenvolvimento da rede dendrítica das células nervosas, a partir da experiência motora, o que amplia os circuítos sinápticos que são básicos no estabelecimento de conexões associativas fundamentais no processo de pensar. Isto comprova o prejuízo que pode ocorrer na estruturação mental de uma criança ao ficar imobilizada muitas horas de sua vida diante da tela da televisão.

 

   
           
         
     

 

   
     

Atualizado em 10/10/00

   
     

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