Ministério
quer incentivar projetos arquitetônicos nas construções
populares
Na
última edição do Fórum Social Mundial,
que aconteceu de 26 a 31 de janeiro, foi levantada uma questão
que tem chegado lentamente ao Brasil: a necessidade de projetos
arquitetônicos também nas construções
de habitações sociais. A idéia foi apresentada
pela Secretária Executiva do Ministério das Cidades
e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da
USP, Erminia Terezinha Menon Maricato, que objetiva montar uma
campanha nacional reforçando a necessidade de arquitetura
em todos os níveis sociais. Maricato falou à ComCiência
sobre o projeto e enfatizou: "faltam políticas públicas
que incentivem inovações tecnológicas voltadas
às construções populares".
ComCiência:
A senhora falou sobre a necessidade de projetos arquitetônicos
também nos projetos populares durante o último Fórum
Social Mundial. No que consiste essa idéia?
Maricato: O que estamos discutindo, e
que deve ser lançado em campanha, é o direito à
arquitetura. Queremos dar uma nova qualidade à moradia
popular. Estamos acostumados com aquela organização
de exército das moradias populares, que foi uma estética
trazida pela ditadura. As moradias populares que temos atualmente
costumam estar sempre fora da cidade, da área urbanizada,
longe do comércio e do transporte, por exemplo. Não
queremos colocar moradias térreas numa área central,
mas achamos que mesmo as construções de casas não
devem ser feitas em áreas isoladas. Além disso,
do ponto de vista arquitetônico, é extremamente pobre,
quando não é de má qualidade. A gente entende
que o direito à arquitetura inclui uma moradia confortável,
o que não significa abundância de espaço,
mas sim conforto do ponto de vista térmico, acústico,
ambiental. E por que não ser uma moradia também
mais bonita?
ComCiência:
Quando surgiu a idéia de que os projetos populares
também devem ter um projeto arquitetônico bem planejado?
Maricato: Esse conceito de arquitetura
às classes populares não é novo. Surgiu junto
ao movimento modernista, na Europa, na primeira metade do século
XX, mas chegou recentemente no Brasil. Já tivemos algumas
experiências em São Paulo e no Rio de Janeiro, na
década de 1990. No governo da ex-prefeita de São
Paulo Luiza Erundida, esse conceito foi aplicado em algumas construções
por mutirão. A idéia é antiga, mas no Brasil
é nova.
ComCiência:
Como esse conceito de arquitetura popular pode ser conciliado
com a idéia de construção sustentável?
Maricato: O uso de construção
sustentável tem a ver com a campanha. A idéia é
chegar numa matriz energética menos custosa, inclusive
do ponto de vista do material. O Brasil utiliza materiais que
consomem muita energia na sua produção, como blocos,
tijolos, concreto armado. Poderíamos trabalhar muito mais
com madeira, como fazem o Canadá e os EUA. Porém,
precisamos avançar mais na produção, pois
se houvesse uma construção de moradia social significativa,
existiriam mais avanços tecnológicos na área.
Atualmente, tudo o que se faz deve considerar a sustentabilidade.
A diminuição do consumo de energia é uma
das grandes preocupações do setor de construção.
ComCiência:
O que falta para o país investir em construções
populares bem planejadas?
Maricato: Faltam políticas públicas,
que deram uma recuada nos últimos 23 anos. Além
disso, o progresso tecnológico da habitação
popular é muito lento no país porque a maior parte
da população está excluída do mercado.
Atualmente, 92% do déficit habitacional está abaixo
dos cinco salários mínimos e o mercado só
atinge pessoas acima de, no mínimo, dez salários
mínimos. Hoje temos um mercado muito restrito, fazendo
um produto de luxo. Quando não há perspectiva de
uma produção massiva, a tecnologia não tem
a mesma importância. Temos uma evolução nas
construções de shoppings, nas grandes corporações,
mas isso não é generalizado nas construções
populares. A maior parte das construções populares
é feita com técnicas pré-modernas, é
a auto-construção. Quando houver financiamento para
as moradias populares surgirá um mercado competitivo na
área. Ampliando o mercado, amplia-se o acesso aos bens
essenciais.
ComCiência:
A arquitetura ainda é vista como um supérfluo?
Maricato: Sim, principalmente nos países
subdesenvolvidos. Para que a arquitetura não seja vista
como um serviço supérfluo, ela precisa provar que
é necessária e que pode trazer novidades sem aumentar
o custo. É isso que queremos discutir com a campanha: como
melhorar as condições das moradias populares, sem
ampliar o custo, ou se possível diminuir. Não achamos
que os arquitetos sabem o que a população precisa.
É fundamental trabalhar ouvindo a população.
Nesse sentido, o arquiteto participar de um movimento social mais
amplo: do direito à moradia.
Construção
Sustentável
Construção sustentável é um
novo conceito de construção que promove a
sustentabilidade dos materiais utilizados e do meio ambiente,
por exemplo, através do uso de materiais que consomem
menos energia ao serem produzidos ou aqueles cuja matéria-prima
é mais facilmente reposta. O termo surgiu na década
de 1970, época em que, devido à crise do petróleo
e ao conseqüente aumento do preço do produto
pela Organização dos Países Exportadores
de Petróleo (Opep), as campanhas de redução
do consumo de energia tomaram forma. Mas o conceito ganhou
força após a Conferência Mundial de
Meio Ambiente ECO-92, que aconteceu no Rio de Janeiro, e
ganhou cada vez mais força depois do surgimento de
uma série de ONGs ambientais durante a década
de 1990.
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