A 
                situação das comunidades quilombolas do município 
                do Alcântara (MA), uma das regiões do país 
                que concentra maior número de comunidades descendentes 
                de quilombos, é alvo do documentário Terra de 
                quilombos: uma dívida histórica. O vídeo, 
                que foi dirigido por Murilo Santos e teve financiamento da Fundação 
                Ford, mostra as dificuldades enfrentadas pelas comunidades locais 
                devido à falta de acesso às terras cultiváveis, 
                após a implantação do Centro de Lançamento 
                de Alcântara (CLA), um centro de lançamentos de foguetes 
                controlado pela Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária 
                (Infraero). O CLA é voltado também para a manutenção 
                e atualização de equipagens e para o treinamento 
                de técnicos e engenheiros. 
              De 
                acordo com a antropóloga da Unicamp e diretora na região 
                sudeste da Associação Brasileira de Antropologia 
                (ABA), Emília Pietrafesa, o vídeo visa contribuir 
                para a discussão de várias temáticas, como 
                os direitos humanos, o combate ao racismo e a questão específica 
                das comunidades negras rurais. Para ela, o filme é uma 
                contribuição da ABA para o debate sobre terras de 
                quilombos. "Já existem pesquisadores trabalhando na 
                região há anos. O Murilo [diretor] foi assessorado 
                pelos antropólogos que já estavam em contato com 
                a população da região", afirma Pietrafesa, 
                que realiza uma pesquisa sobre dinâmicas étnicas 
                e territoriais em Alcântara.
              O 
                documentário apresenta narrativas históricas, rituais, 
                festas, formas específicas de trabalho e apropriação 
                das terras e de outros recursos naturais que fundamentam a identidade 
                étnica dessas comunidades. "O filme aborda o processo 
                de deslocamento das famílias para a implantação 
                do CLA", afirma. A pesquisadora acredita que esse processo 
                vem causando a desestruturação dos territórios 
                étnicos, apesar do amparo constitucional presente no art 
                68 da Constituição, segundo o qual os remanescentes 
                das comunidades de quilombos têm direito à propriedade 
                definitiva das terras que estejam ocupando, o que deve ser assegurado 
                pelo Estado. 
              Pietrafesa 
                conta que, durante a implantação do CLA, entre 1986 
                e 1987, dezessete povoados foram deslocadas, agrupados e instalados 
                em sete agrovilas inférteis distantes do mar - sendo que 
                são comunidades de agricultores e de pescadores. "O 
                caso de Alcântara é paradigmático de como 
                o Estado vem tratando a questão das comunidades negras 
                rurais", complementa. As terras de Alcântara, segundo 
                informa a antropóloga, são de direito combinado 
                entre o coletivo e o privado - sendo o "privado" entendido 
                como "familiar", e não como "individual". 
                "As comunidades que ainda não foram deslocadas avançam 
                sobre as terras disponíveis de acordo com as necessidades 
                de cada família", ressalta. 
              O 
                vídeo é explícito em relação 
                às palavras da antropóloga e revela uma intransigência 
                por parte do Estado, no caso, representado pelo CLA: o crescimento 
                populacional fez surgir uma nova classe de trabalhadores, os arrendatários, 
                já que as formas específicas de trabalho e apropriação 
                da terra - citadas pela pesquisadora - foram impedidas de se reproduzir. 
                Assim, não há mais possibilidades da população 
                avançar sobre as terras de acordo com suas necessidades.
              Terra 
                de Quilombos: uma dívida histórica deve estar, 
                em breve, disponível para compra no site 
                da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) por 
                R$10,00 e será apresentado na Mostra de Ciência no 
                Cinema, que acontecerá entre os dias 25 e 29 de outubro, 
                na Casa do Lago da Unicamp. A Mostra de Ciência no Cinema 
                integra a programação da primeira Semana 
                Nacional de Ciência e Tecnologia.
                
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