Em entrevista concedida à ComCiência, o diretor do Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, fala sobre as pesquisas na área de saúde, que representam cerca de 25% de toda a pesquisa realizada no Brasil. Para ele, um dos principais problemas da área está ligado ao chamado "complexo industrial da saúde", ou seja, à concentração de pesquisas em empresas, de acordo com os interesses do mercado. Além de professor da Faculdade de Medicina da UFRJ e do Instituto de Medicina Social da UERJ, Guimarães já foi coordenador do Centro de Estudos da Presidência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), presidente do Conselho Superior da Faperj, consultor do CNPq e ex-diretor do Instituto Ciência Hoje.
ComCiência - Qual é a situação atual das pesquisas em saúde no Brasil?
Guimarães- Segundo números do CNPq, colhidos ao longo da década 90 e início da década atual, a pesquisa em saúde no Brasil perfaz algo em torno de 25 a 30% de todo o esforço de pesquisa existente no país, em todas as áreas do conhecimento. Isto porque a pesquisa em saúde não é só realizada na grande área da saúde, como a medicina, enfermagem, saúde coletiva, mas também nas engenharias, na química e nas ciências sociais. Levando-se em consideração este conceito abrangente, deve-se ter hoje cerca de 5 mil grupos de pesquisa ativos em universidades e institutos de pesquisa que tenham pelo menos uma linha de pesquisa vinculada à saúde humana. É, certamente, o maior setor de pesquisa no país. Para fornecer um elemento de comparação, o esforço de pesquisa em saúde no Brasil é aproximadamente o dobro da pesquisa agropecuária, que é também muito importante no país.
ComCiência - Em saúde, quais são as áreas que concentram o maior número de pesquisas?
Guimarães- Temos um leque muito aberto, fazemos pesquisa em saúde numa amplitude muito grande de campos de interesse. Cerca de 50% do esforço de pesquisa em saúde está vinculado às ciências da saúde, cerca de 25% está vinculado às ciências biológicas e os 25% restantes às demais grandes áreas do conhecimento. A porcentagem referente às ciências biológicas referem-se a grupos pertencentes às áreas de bioquímica, biofísica, farmacologia, neurociências, genética, etc. Entre as outras grandes áreas do conhecimento, as ciências humanas, as ciências agrárias e as ciências sociais aplicadas possuem uma presença maior. As engenharias e as ciências exatas e da terra estão menos presentes.
ComCiência - Quais são os problemas existentes no campo das pesquisas em saúde no Brasil?
Guimarães- No mundo todo existe uma aproximação crescente entre as opções de pesquisa em saúde e as prioridades de políticas de saúde. Já no Brasil, desde a década de 50, observou-se um relativo afastamento entre as prioridades de pesquisa e as prioridades das políticas de saúde. Esse é um problema que temos hoje. Outro problema é a pesquisa desenvolvida no chamado "complexo industrial da saúde". Nos países ricos, uma parte muito grande da pesquisa em saúde é feita nas empresas, no complexo farmacêutico, nas empresas biotecnológicas que produzem vacinas, nas que produzem equipamentos médicos etc. Existe um componente muito grande de pesquisa nessas empresas. No Brasil, isso é muito incipiente pelo próprio padrão da industrialização brasileira, que sempre foi muito associado internacionalmente, e subordinado também. E principalmente pelo que aconteceu durante a década de 90, que foi uma abertura comercial indiscriminada, que prejudicou muito certos setores estratégicos na área de empresas do complexo industrial da saúde que deveriam ter sido, eu acho, mais defendidas.
ComCiência - Quais são as prioridades das políticas de saúde no país?
Guimarães- Entre as prioridades, é importante citar a tuberculose, a dengue e a aids. Além disso, é preciso também realizar pesquisas em Demografia e Saúde, para atualizar dados sobre a saúde de mulheres e crianças no Brasil, por exemplo. No campo da pesquisa clínica, queremos montar uma rede para reforçar a sua infra-estrutura, tendo como base, na parte física, os hospitais universitários e os hospitais de ensino em todo o Brasil. Estamos trabalhando na idéia de fazer um conjunto de centros gerais de pesquisa clínica, que seriam infra-estruturas, pequenas enfermarias e instalações nos hospitais de ensino capazes de abrigar pacientes que estivessem participando de protocolos de interesse do Sistema Único de Saúde (SUS), de interesse da política de saúde.
ComCiência - Como será financiado este trabalho?
Guimarães- Os recursos do Ministério da Saúde como um todo para C&T, incluindo seus institutos de pesquisa, serão quase R$ 300 milhões. Para o ano de 2004, deste montante, o Ministério da Saúde destinou cerca de R$ 70 milhões para o Departamento de Ciência e Tecnologia. Só para fins de comparação, em 2002 foram R$ 13 milhões. Em 2005, a idéia é destinar o mesmo deste ano, algo em torno de R$ 70 milhões.
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