Plano BR 163 sustentável ainda não
tem ordenamento territorial
Entre as polêmicas levantadas acerca das obras de pavimentação da Cuiabá-Santarém (BR 163) está a preocupação não apenas com os impactos ambientais, mas também os sociais, que envolvem a disputa dos moradores da área de influência da obra com grileiros. De acordo com Ludmila Caminha, assessora de políticas públicas da organização não governamental WWF-Brasil, é possível evitar os conflitos sócio-territoriais se for feito, antes do início das obras, um ordenamento territorial, que definirá os donos e usos da terra. Segundo documento produzido, em julho deste ano, pelo Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), a rodovia terá investimento superior a um bilhão de reais e poderá levar de 4 a 14 anos para ser concluída.
Caminha acredita que, embora muitos moradores da região sejam a favor do asfaltamento da BR, há uma preocupação real para que o plano de desenvolvimento sustentável da estrada faça o ordenamento territorial antes do início das obras.
A pavimentação da Cuibá-Santarém é parte do Plano Amazônia Sustentável (PAS) e tem como objetivo melhorar o acesso da população que vive nas proximidades, favorecer o desenvolvimento econômico e social da região, além de reduzir os custos de transporte de cargas na área que abrange os estados do Mato Grosso e Pará. Algumas estimativas prevêem que haveria uma redução de R$ 150 milhões ao ano nos custos da soja transportada do Mato Grosso, ou cerca de R$ 3 por saca. Atualmente, a produção da soja é exportada pelos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR) e, com a pavimentação da rodovia, passaria a ser feita pelo porto de Santarém (PA), diminuindo o percurso em cerca de 600 km.
A
BR 163 já está asfaltada de Cuiabá até
a divisa dos estados do Mato Grosso com o Pará e a parte
a ser pavimentada segue deste trecho até a cidade de Rurópolis
(PA), somando 816,20 km. Durante a estação chuvosa,
o trecho paraense da BR chega a ficar intransitável e os
constantes buracos e pontes de madeira foram apelidados de "estrada
do inferno", pelos moradores da região.
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Trecho
paraense da BR 163 que deverá ser pavimentada.
Fonte: EIA-Rima
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Trecho
danificado da BR 163
Fonte: EIA-Rima
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O
plano da BR-163 sustentável deverá ser concluído
ainda em outubro 2004, sendo que as obras emergenciais serão
iniciadas ainda neste ano. Em meados de 2005 está previsto
o começo da pavimentação.
Riscos de conflitos
Apenas o anúncio de que as obras começariam, em meados de agosto, já foi motivo para intensificar os conflitos sócio-territoriais na região. Caminha explica que a região de influência das obras é uma área, como boa parte da Amazônia, onde os grileiros agem com freqüência. Roberto Esmeraldi, diretor da Amigos da Terra, uma Organização Não Governamental, informa que a construção da estrada parece simples, mas gera inúmeros conflitos que são resolvidos mesmo na ausência do poder público.
Para garantir a posse dos moradores de pequenas e antigas propriedades - geralmente os primeiros a serem expulsos na construção de estradas - seria necessário reservar uma faixa de 50 km de cada lado da rodovia para realizar o ordenamento territorial. Esmeraldi explica que é preciso evitar casos como o do município de Juruti-PA, onde pessoas que moram há 80 anos na região estão perdendo suas terras para grileiros. "É possível que os moradores antigos passem a ser vistos como os invasores, pois, por causa da construção de uma estrada, o hectare da terra passa de R$ 50 a R$ 2 mil", informa. Segundo o diretor da Amigos da Terra, é possível distinguir dois tipos de ocupação na região: "uma é a legitimidade sem título, e a outra é o título sem a legitimidade".
O Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima) da obra estima que cerca de 1.800 operários serão contratados no período de quatro anos necessários para a finalização dos trabalhos de pavimentação e construção de pontes. No entanto, o Ministério dos Transportes prevê, baseado na liberação de recursos dos últimos oito anos, que as obras sejam concluídas em 14 anos.
Além da pavimentação da BR 163, serão construídas 64 pontes de concreto e cerca de 1120 bueiros. O canteiro de obras envolve ainda a construção de alojamentos, a instalação de equipamentos e a disponibilização de redes públicas de energia, água, telefonia e saneamento básico. Para tanto, será iniciada a limpeza do terreno nas áreas de movimentação das máquinas, o que afetará casas, prédios e espaços de lazer (como praças), que deverão ser removidos por meio de um acerto financeiro feito antes do início das obras. Nos municípios de Traião e Novo Progresso (PA) existem casos de prédios e praças que já estão sendo negociados.