Medidas sinalizam melhorias em regiões 
							quilombolas, mas demora é criticada
						O direito dos remanescentes de quilombos (quilombolas) à terra é apontado como uma das principais "dívidas históricas" da nação brasileira. A aprovação do Decreto 4.887/2003 
							(leia mais)  em novembro passado, que estabeleceu critérios para titulação das terras de quilombos, e a destinação de verbas as comunidades quilombolas por meio do Plano Plurianual (PPA 2004-2007) são sinais positivos de uma maior preocupação do governo com a questão. Porém, de acordo com as entidades relacionadas à defesa dos direitos quilombolas, poucas medidas concretas foram tomadas desde a aprovação do decreto no ano passado. 
						
            Segundo 
              dados divulgados pela Comissão 
              Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP), no Plano 
              Plurianual está previsto para este ano um investimento de 
              mais de 14 milhões de reais em atendimento e regularização 
              da situação fundiária de comunidades quilombolas. 
              Consta ainda no Plano que até 2007 devem ser liberados cerca 
              de 68 milhões de reais com a mesma finalidade. 
						Para a pesquisadora e coordenadora executiva da Comissão Pró-Índio e do Projeto Quilombola, Lúcia Morato de Andrade, faltam medidas concretas do governo que transformem a boa vontade em ações reais em benefício dos quilombolas. "Os dados que obtemos junto ao Instituto de Estudos SócioEconômicos (INESC) mostram que apenas 0,63% (menos de 93 mil reais) foram liquidados até maio desse ano. Se os recursos existem é preciso começar a agir", criticou Andrade.  Segundo a coordenadora, o governo ainda não definiu com clareza como pretende agir e quais os caminhos e critérios serão adotados. "As ações ainda são muito pulverizadas e medidas importantes que não demandam grandes investimentos como definição do plano de etnodesenvolvimento ainda não se concretizaram", complementa.
						Apesar das críticas, o Instituto Nacional de Colonização de Reforma Agrária (INCRA), uma das principais entidades governamentais envolvidas com a questão de regularização das terras dos remanescentes de quilombo, afirma estar trabalhando em caráter de urgência na definição e destinação dos 14 milhões previstos para serem gastos esse ano.  Segundo Maria Aparecida Rodrigues Campos, da coordenadoria geral de projetos especiais do Incra, foi definido que serão atendidas a princípio 32 comunidades quilombolas cadastradas na Fundação Palmares, entidade que é ligada ao Mistério da Cultura e busca assegurar a pluralidade étnica brasileira. As comunidades devem também integrar o Programa Fome Zero e/ou estarem localizadas em áreas consideradas conflituosas. 
						
							Marcha lenta e risco de retrocesso
							A previsão do Incra é de que o dinheiro esteja nas regionais ainda em agosto, quando começará o processo de regularização das comunidades escolhidas. Além das 32 comunidades, segundo Campos, existe a possibilidade de regularizar outras comunidades quilombolas que estejam em situação de fácil solução, como em algumas terras de propriedade do governo. Estima-se que existam no Brasil mais de 2 mil comunidades quilombolas, sendo que apenas no Maranhão são mais de 400. A dimensão da questão torna difícil para as próprias entidades envolvidas fazerem uma previsão da quantidade de verba e tempo que seriam necessários para equacionar o problema.  
						A regularização ou titulação das 32 comunidades pelo Incra ainda esse ano representaria menos de 2% do total de comunidades quilombolas do país. Ainda assim, outras medidas como a criação de condições para o desenvolvimento sócio-econômico e sustentável dessas comunidades precisariam ser tomadas. Existem casos graves como o da base militar de Alcântara no Maranhão, construída em uma área onde estão concentradas mais de 200 comunidades quilombolas à espera de uma definição do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Ministério da Defesa. 
						
							
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								| Morador fazendo cofos na Comunidade de Samucagaua, em Alcântara, no Maranhão. | 
							
						
						
             "A 
              única escola de segundo grau e o único hospital de 
              Alcântara estão fechados. Alcântara está 
              praticamente parada: menos de 20 comunidades foram até agora 
              transformadas em agrovilas ou deslocadas, as outras estão 
              no abandono", desabafou Raimundo Maurício Matos Paixão, 
              coordenador do Centro de Cultura 
              Negra do Maranhão (CCNMA). De acordo com ele, cerca de 
              13 processos de regularização estão parados 
              no Incra apenas por pequenas pendências. "Estamos lutando 
              para que essas comunidades recebam a titulação das 
              suas terras ainda esse ano", afirmou. 
						Outra preocupação dos líderes dessas entidades está relacionada ao pedido do PFL de anulação do Decreto 4.887/2003 por inconstitucionalidade feito no final de junho. O partido ataca alguns pontos do decreto como a definição das terras quilombolas e de quais comunidades teriam direito sobre as terras, assim como o pagamento de indenização pelo governo aos donos dos títulos de propriedade de terras onde vivem comunidades remanescentes de quilombo.  
						
            "O 
              decreto ainda nem foi aplicado direito e já estão 
              querendo anular. Isso nos preocupa porque essa regulamentação 
              cria justamente condições para a titulação 
              das terras. Não tenho idéia de como pode acabar esse 
              julgamento, mas precisamos pressionar para que o pedido do PFL não 
              seja atendido", enfatiza Andrade.
						Crédito da foto: Arquivo do Centro Cultura Negra do Maranhão