Brasil
lidera rede internacional de cooperação tecnológica
para combate à Aids
A
rede de cooperação tecnológica em HIV/Aids,
formada por seis dos países mais populosos do mundo - China,
Rússia, Nigéria, Ucrânia, Tailândia e
Brasil - e liderada pelo Brasil, foi, na opinião de profissionais
e pesquisadores da área, a iniciativa mais importante da
XV Conferência Internacional de Aids, realizada recentemente
em Bangcoc. "A rede talvez tenha sido, dentro das ações
paralelas durante a Conferência, a de maior repercussão
e relevância", afirma o Diretor do Programa Conjunto
das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) para a Europa
e Américas, Luiz Loures, em entrevista à Agência
de Notícias da Aids. O
objetivo principal da rede é garantir o acesso ao tratamento
anti-retroviral (ARV), que está ameaçado pelo acordo
Tratado de Propriedade Intelectual (Trips). A partir de 2005, todos
os países signatários da Organização
Mundial do Comércio (OMC) deverão se adequar ao Tratado,
o que pode levar à redução dos investimentos
nos países em genéricos e, conseqüentemente,
aumentar o custo do tratamento para a Aids.
Os
países que integram a rede ocupam posições
estratégicas em suas regiões e podem exercer liderança
na produção de ARV, segundo o diretor do Programa
Nacional de DST/Aids, do Ministério da Saúde, Alexandre
Granjeiro. Além disso, estes países dominam tecnologias
complementares, o que possibilita que todos obtenham avanços
na capacidade tecnológica. De acordo com o diretor, as áreas
de atuação serão concentradas em medicamentos
- visando atender o sistema de saúde pública e desenvolver
novos produtos - além de preservativos, vacinas e insumos
farmacêuticos. "A idéia e incentivar os países
a produzirem ARV nacionalmente e garantir que aqueles sem condições
de fazê-lo possam importar dos demais membros da rede",
afirma. A parceria vai atingir cerca de 1,8 bilhão de pessoas,
correspondente à toda população dos países
envolvidos.
Nesta
primeira fase, o Brasil vai assumir a coordenação
do intercâmbio. Grangeiro explica que haverá um grupo
técnico responsável pelo trabalho, composto por representantes
de cada um dos países membros. "Ou o Brasil investe
pesado para fabricar os anti-retrovirais genéricos ou começa
a ficar defasado para produzi-los", afirma o diretor. Para
ele, é preciso evitar que os novos medicamentos, que são
mais caros e complexos, sejam monopólio da indústria
farmacêutica. "A rede foi estruturada para evitar essa
defasagem tecnológica no Brasil e, ao mesmo tempo, ampliar
a tecnologia para outros países. Precisamos fazer isso em
dois, três anos. Se não conseguirmos, dentro desse
período a produção de genéricos ARV
ficará praticamente inviabilizada", alerta Grangeiro.
Na
opinião de Loures, diretor do Unaids, o fato desses países
trabalharem juntos na transferência de tecnologia na produção
de genéricos, em relação aos aspectos de propriedade
intelectual, aumenta, sem dúvida, o poder de negociação
e barganha desses próprios países e isso vale para
todo o mundo em desenvolvimento nas plataformas e fóruns
onde esta discussão é cada vez mais presente. "O
crescimento da presença de insumos na luta contra a Aids
leva diretamente a uma relevância cada vez maior dos tratados
de comércio em relação a uma resposta à
Aids nos países. Este movimento do Brasil é muito
importante e altamente estratégico", conclui Loures.
O projeto da rede de tecnologia já conta com US$ 1 milhão
para a sua implantação. Os recursos vêm da Fundação
Ford, instituição privada norte-americana sem fins
lucrativos.
As
pesquisas no Brasil
Inicialmente, será feito um diagnóstico do quadro
tecnológico atual de cada país, a começar pela
Nigéria e pelo Brasil. A partir disso, será possível
saber quais áreas serão priorizadas. O principal interesse
levantado pelo grupo nesse início de trabalho é a
produção de medicamentos. "O Brasil também
possui interesse na tecnologia de produção de preservativos
por outros países, pois está implantando uma fábrica
no Acre através de um projeto sustentável de extração
da borracha com a população local de seringueiros",
afirma Luís Fernando Brígido, assessor técnico
da área de pesquisa do Programa Nacional de DST/Aids.
Os
laboratórios estatais brasileiros fabricam hoje sete medicamentos
anti-retrovirais. Destes, a Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz), por meio do Instituto de Tecnologia em Fármacos
(Far-Manguinhos) e do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos
(Bio-Manguinhos), é hoje o principal aliado do governo na
produção e pesquisa de medicamentos, testes e vacinas
para Aids. "Os institutos de química da USP e da UFRJ
também vem contribuindo com pesquisas muito interessantes
na área", afirma Brígido.