Brasil assinou, mas não ratificou, tratado da FAO sobre
fitogenéticos
Assinado,
mas ainda não ratificado pelo Brasil, o Tratado Internacional
sobre Recursos Fitogenéticos (plantas) para a Alimentação
e Agricultura, que entrou em vigor em 29 de junho de 2004, objetiva
facilitar o acesso e repartição dos benefícios
derivados do uso de recursos fitogenéticos (plantas) com
grande importância para a agronomia, especialmente para a
agricultura sustentável, e para a segurança alimentar
mundiais. O tratado, que é da Organização das
Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO, em inglês), busca facilitar também a conservação,
pesquisa e melhoramentos de plantas importantes para alimentação
humana, sem incluir a utilização industrial, farmacêutica
ou química dos recursos genéticos disponibilizados
pelo documento, que foi ratificado até agora por mais de
40 países.
"O
tratado é importante porque propicia uma maior liberalidade
para a troca do produto básico das pesquisas agronômicas"
informa José Montenegro Valls, pesquisador da Embrapa Recursos
Genéticos e Biotecnologia, uma das unidades de pesquisa responsáveis
pelo estudo da biodiversidade do país.
Segundo
o pesquisador, o Brasil seria muito beneficiado pela implementação
do tratado já que, apesar de ser o maior detentor de biodiversidade
do mundo, não conta com agrobiodiversidade - diversidade
de plantas especialmente importantes para a agricultura - suficiente
para manter seus níveis de exportação, uma
vez que a alimentação e a exportação
brasileiras são baseadas em os produtos exóticos,
ou seja, plantas nativas de outros países. "Nossa economia
agrícola está baseada em cultivares de fora do Brasil",
informa Valls.
Sob
esta ótica, o tratado não abriria portas de saída
para a biodiversidade nacional e, ao contrário disso, possibilitaria
a entrada de plantas de outros países de grande importância
para a pesquisa agrícola nacional. O instrumento da FAO possibilitaria
assim a disponibilização de mudas ou sementes de plantas
que não passaram por processos de melhoramento genético,
ou germoplasma bruto, para utilização em pesquisa
de domínio publico, não disponibilizando, porém
os cultivares já protegidos por leis de propriedade intelectual
dos países que ratificaram o tratado.
De
acordo com a lista de cultivos abertos para intercâmbio facilitado,
segundo Valls, o Brasil praticamente só recebe recursos fitogenéticos.
Até o momento, o tratado inclui 35 espécies de cultivo
agrícola como o milho, arroz, feijão, trigo e mandioca.
Por outro lado, o pesquisador sinaliza também que não
foram incluídos, até o momento, produtos de grande
importância para o agronegócio brasileiro como o café,
a cana-de-açúcar e a soja. "O Brasil não
dispõe de germoplasma nativo de citros. O melhoramento depende
de totalmente de germoplasma exótico" comenta o pesquisador.
O
Brasil foi muito atuante na fase inicial de elaboração
do tratado, porém, não foi um dos primeiros a ratificá-lo
e ainda não garantiu o direito ao voto nas reuniões
que estabelecerão os parâmetros do seu funcionamento.
"O Brasil só poderá entrar depois de 90 dias"
informa Valls.
"Os
produtos não incluídos no tratado serão rediscutidos
na primeira reunião, além disso, existe a possibilidade
de que os países façam novas ofertas de plantas para
a inclusão no tratado" acredita Leontino Taveira, engenheiro
agrônomo do Serviço Nacional de Proteção
de Cultivares.
Segundo
Taveira, o tratado da FAO estabelece um termo já habitual
para os pesquisadores em melhoramento genético, o termo de
transferência de material, não havendo desta forma
maiores dificuldades técnicas para que o país cumpra
o Tratado e estimule assim novos contatos e trocas de materiais
genéticos com outros países, segundo a opinião
de Tavieira. "Nós encaramos este tratado como uma forma
de fomentar o nosso trabalho", comenta.
Aos
países que disponibilizarem o acesso às plantas de
importância para a agricultura e alimentação
existe a previsão da repartição dos benefícios
por meio da transferência de tecnologia, de capacitação
e de intercambio de informações. Os detalhes desta
repartição de benefícios, entretanto, serão
discutidos e acertados nas demais reuniões que antecedem
a implementação do tratado.
Outros
aspectos a serem discutidos nas próximas reuniões
da FAO são os casos em que as pesquisas culminam em uma variedade
ou um produto economicamente explorável, mas não podem
ser utilizados por terceiros, por serem objeto de mecanismos de
propriedade intelectual, como a Lei de Proteção de
Cultivares. Para estes casos, existe a previsão de pagamentos
monetários a serem reunidos em um fundo internacional.
Além
disso, outro ponto relevante abordado pelo tratado é o que
se estende ao acesso de coleções de plantas mantidas
em fora de seu ambiente natural (ex situ), em centros de pesquisa
em agricultura, mantidos por diversos países.
Segurança
alimentar e perda de biodiversidade
Segundo
dados da FAO, uma dezena de espécies animais fornece
cerca de 90% por cento das proteínas consumidas mundialmente
e apenas 4 tipos principias de cultivos fornecem metade
das calorias de origem vegetal presentes na alimentação
humana mundial. Estes dados se tornam ainda mais alarmantes
pela constatação, também da FAO, de
que foi perdido, ao longo do último século,
quase 75% da diversidade genética utilizada em cultivos
agrícolas em todo o mundo.
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