Marketing
na ciência denuncia a
falta de investimentos no setor
Não
apenas as grandes empresas preocupam-se em vender uma boa imagem
de seus produtos, mas os cientistas e as instituições
científicas também utilizam o marketing para solidificar
a imagem benevolente da ciência, estimular a confiança
e o investimento em pesquisas. Foi o que observou Alessandra Pinto
de Carvalho em sua tese de doutorado defendida na Universidade Metodista
de São Paulo (Umesp). "Os pesquisadores muitas vezes
reclamam que os jornalistas são sensacionalistas e buscam
apresentar nas matérias apenas o que interessa à mídia,
mas eles fazem a mesma coisa quando estão à frente
das produções e podem monitorar o que vai ser divulgado
no vídeo", afirma a pesquisadora, que analisou nove
documentários em vídeo encomendados por instituições
públicas de pesquisa à empresa Videociência,
produtora independente de vídeos.
Para
explicar como funciona o marketing da ciência, Carvalho compara
a atividade científica a de uma "empresa" que vende
idéias, ou seja, o conhecimento produzido. Nesse mercado
não há bens duráveis, mas sim um conjunto de
símbolos, teorias e fórmulas que podem ser transmitidas
como propaganda e desse modo, obter o reconhecimento dos setores
de incentivo com verbas e investimentos. "Posteriormente, isso
até pode ser retornado para o mundo em forma de produtos
duros, mas o mercado do conhecimento está mais ligado ao
mercado de símbolos", completa.
A
pesquisa intitulada A divulgação e o marketing
da ciência - uma análise do documentário como
instrumento híbrido de comunicação científica
pública analisou a estrutura e o formato de documentários
produzidos entre os anos de 1990 a 2000, com ênfase para os
tipos de discursos, argumentos, personagens, apresentação
e contexto. O mais antigo vídeo analisado foi produzido para
o instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 1994, de
título SCDI - O Brasil no espaço, que trata
das bases do programa de pesquisas que proporcionou o lançamento
do primeiro satélite brasileiro. Um dos documentários
mais recentes é O méson pi e a ciência no
Brasil (1999), que trata dos estudos de física no país,
com ênfase para a participação de César
Lattes na história da ciência brasileira. O vídeo
foi encomendado pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas
e pela Academia Brasileira de Letras.
Para
a interpretação dos vídeos foram utilizados
conceitos e funções de marketing e propaganda institucional.
As análises mostraram que esse tipo de produção
audiovisual ultrapassa a forma jornalística do discurso imparcial
e imprime no texto a visão do produtor. "A imagem da
atividade científica que se apresenta é aquela que
promove o bem de todos, o progresso da nação e do
conhecimento. Agregando estas percepções com as recomendações
da divulgação empresarial, lançamos o conceito
de marketing científico", explica Carvalho, que contou
com a orientação do professor e jornalista científico
Wilson da Costa Bueno.
De
acordo com especialistas, o emprego do marketing no campo científico
nem sempre é visto com bons olhos. Wilson Bueno acredita
que o marketing pode ser positivo quando mostra a importância
e a necessidade de se investir em ciência, mas o próprio
conceito e a prática usual do marketing da ciência
extrapolam os limites éticos e vinculam-se à promoção
de produtos e pessoas, sem que haja compromisso com a qualidade
da informação e com a democratização
do conhecimento.