Reforma universitária terá proposta oficial este mês
Até o final de maio o Ministério da Educação (MEC) apresentará a primeira versão oficial da proposta de reforma universitária do país. O documento, que ainda será discutido detalhadamente, deve ser a prévia do projeto de Lei Orgânica do Ensino Superior, previsto para ser enviado até novembro deste ano ao Congresso Nacional. Pelo menos doze itens propostos pelo MEC já são consensuais, entre os quais a criação do Fundo de Financiamento das Universidades, a expansão das instituições federais de ensino superior conforme demandas regionais de desenvolvimento e a eleição direta para reitores.
Um dos problemas mais evidentes que a reforma universitária pretende combater é a questão do sucateamento das instituições de ensino superior. Segundo Ricardo Musse, do Departamento de Sociologia da USP e coordenador do Fórum de Políticas Públicas desta instituição, o modelo de universidade que temos é uma herança do regime militar, revisada pela política neoliberal dos anos 90 e é preciso reorientá-la aos moldes dos novos consensos da sociedade brasileira. "Os gargalos encontram-se na própria universidade, nas instituições que a tutoram e na situação fiscal do país. A falência do Estado - fruto de uma política irresponsável de privatizações e de populismo cambial que dobraram a dívida pública - impede e dificulta novos investimentos, forçando a universidade pública a optar por soluções criativas para a abertura de novas vagas", conclui o professor.
Uma das alternativas para resolver o problema da restrição de vagas nas instituições de ensino superior é o programa "Universidade para Todos", em estudo há algum tempo, que prevê a criação de vagas públicas para estudantes carentes nas instituições particulares por meio de um sistema de compensação de impostos. Esta proposta atuaria também no combate ao caráter mercantilista do ensino particular.
Segundo Musse, em algumas localidades já existem leis que destinam um percentual das vagas das universidades gratuitamente às pessoas carentes. Mas, principalmente pela falta de qualquer controle do Estado, muitas acabam destinando essas vagas para beneficiar amigos e parentes, ou essas cotas misturam-se ao sistema de bolsas parciais, distorcendo a oferta real de vagas gratuitas.
A reforma também implicará em uma espécie de ajustes de conduta das instituições públicas e privadas de ensino superior. Conforme declarou o ministro da Educação, Tarso Genro, em entrevista concedida à Revista Ensino Superior (edição 67), a meta é criar estruturas que realmente contribuam para a inclusão social, a redução das desigualdades regionais quanto à qualidade das universidades e o desenvolvimento de centros de excelência em pesquisa e ensino no país. O projeto é uma proposta do próprio ministro e será apresentado na forma de Lei Orgânica do Ensino Superior para o Congresso Nacional e pretende beneficiar especialmente as minorias sociais.
Outra forma de ampliar os recursos das instituições de ensino superior poderá ser a proposta de se criar o chamado Fundo de Financiamento das Universidades - discutido durante o 2o Colóquio de Entidades de Ensino Superior, que aconteceu no final de abril, em Brasília - que poderá fortalecer as agências de fomento, dos fundos setoriais e das fundações de amparo à pesquisa. Esse Fundo seria definitivo para garantir a verdadeira autonomia das universidades e seria composto por um conjunto de alíquotas de impostos, como já acontece com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), cuja arrecadação básica equivale a 10% do montante recolhidos por meio de impostos como o ICMS, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de Exportação, Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), em substituição ao "provão", também foi bastante questionado. A Lei 10.861, que coloca em vigor a nova forma de avaliar as universidades brasileiras foi assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no último dia 14 de abril. O Sinaes visa analisar o perfil dos cursos e a estrutura das instituições, e não mais no desempenho dos alunos.
A partir da publicação da lei, no dia 15 de abril, estabeleceu-se o prazo de 60 dias para instalar a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) que deverá estabelecer os parâmetros gerais e as diretrizes para a operacionalização do novo sistema; e Comissões Próprias de Avaliação (CPAs) nas instituições de ensino superior em todo o país para realizarem a auto-avaliação institucional.
Discussão ampliada
O Fórum da USP encaminhou propostas sobre a reforma universitária ao MEC em novembro do ano passado. Entre as sugestões, destaca-se a questão da autonomia de gestão e orçamento nas universidades. "É preciso decidir internamente e em diálogo com a sociedade local que metas devem ser priorizadas por meio de planos anuais ou bienais, levando em conta suas necessidades específicas", comenta o sociólogo da USP.
Os debates para a elaboração do projeto para a reforma universitária já acontecem desde o ano passado, ainda quando Cristovam Buarque estava à frente do Ministério da Educação. O atual ministro, Tarso Genro, deu continuidade ao trabalho e ampliou as discussões. A Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) também tem promovido uma série de seminários para contribuir com as discussões de forma regionalizada, e a União Nacional dos Estudantes (UNE) ampliou os debates através da Caravana Une pelo Brasil, que envolve 31 instituições de 20 estados brasileiros que serão percorridos até o fim deste mês. Para o próximo dia 1o de junho, está programada uma miniconstituinte regional promovida pelo MEC na cidade de Belém, no Pará.