Arquivo da categoria: artigo

Capitalismo e fome

Por Plínio de Arruda Sampaio Júnior

O problema não é a existência de um excedente populacional insustentável, como apregoam as teorias de inspiração malthusiana muito em voga nos meios reacionários. Não existem dificuldades materiais insuperáveis que expliquem a fome. Sabe-se perfeitamente que há muito tempo a capacidade de produção de alimentos é mais do que suficiente para satisfazer toda população mundial. Hoje, ela é mais do que o dobro da necessária. Continue lendo Capitalismo e fome

O pescado e a segurança alimentar

Por Juliana Schober Gonçalves Lima

Apesar da elevada qualidade nutricional do pescado, mecanismos que orientam os modos de produção e comercialização podem impedir que esse alimento seja amplamente consumido, sobretudo pelas populações que mais precisam, que são aquelas de baixo poder aquisitivo e subnutridas. Uma estimativa recente mostra que antes da pandemia de covid-19, quase 690 milhões de pessoas no mundo, ou seja, cerca de 8,9% da população global, estavam subnutridos (conhecido como “SOFI” report, 2020). Esse número elevado de subnutridos demanda estratégias eficazes de combate à desnutrição e o pescado tem um papel muito relevante nesse contexto. Continue lendo O pescado e a segurança alimentar

Contra o marasmo autocongratulatório em divulgação científica

Por Peter Schulz

Nesses dias, há mais de um ano trabalhando em casa, rememoro a vida presencial anterior na universidade. Presencial, sim, mas já isolada em várias dimensões. Como era difícil (e piorou) conversar, todo mundo encastelado em seus respectivos laboratórios ou em intermináveis reuniões administrativas sem novas ideias. E assim alongam-se currículos. Mas o que se perde com isso? Um exemplo, que talvez inspire para oxigenar nossa academia: a Academia Olímpia. Continue lendo Contra o marasmo autocongratulatório em divulgação científica

O Estado como peste

Por Roberto Romano

A pandemia dizima milhões de pessoas em tempo rápido.  Ela traz a ruína de Estados, economias, sociedades. Ao surgir sem previsão seus ataques corroem culturas, restauram crendices, exasperam a insegurança coletiva. Ela radicaliza tragédias vividas pela Humanidade desde os mais remotos tempos. Um de seus modernos efeitos calamitosos é o acirramento de ideologias. É como se, ao aproveitar a irrupção malsã, formas cruéis de pensamento ressurgissem em todas as nações. O nazismo, o fascismo e forças religiosas retrógradas apresentam caraterística comum, pois desprezam e refazem calúnias contra a ciência, sobretudo no terreno médico. “Deus, Pátria, Família”– o lema dos que defendiam o Sigma – ilustra a nova guinada do poder erguido sobre o irracional. A pesquisa paciente e serena, a busca incessante de fatos e de evidências, as tentativas de localizar remédios, tudo de repente é preterido, vencem as mensagens trocadas na internet. Os atentados misólogos  brotam dos lábios de quem  preside o país. No atual governo ninguém escapa da crendice autoritária, sobretudo os que deveriam gerir a saúde. Continue lendo O Estado como peste

A desdemocratização e seu rastro

Por Luis Felipe Miguel

ilustração de Céllus

Como foi possível a vitória de Bolsonaro, em 2018? Os analistas políticos elencam um bom número de motivos – o veto de setores poderosos ao Partido dos Trabalhadores e à centro-esquerda em geral, as intervenções de força que macularam a legitimidade do pleito (como a prisão do ex-presidente Lula), a massiva campanha de desinformação, o efeito da facada de Juiz de Fora. Ainda assim, é chocante pensar que quase 58 milhões de brasileiros julgaram que o ex-capitão, com tão notória ficha corrida, poderia ocupar a presidência da República. Passados quase dois anos e meio, a pergunta é outra, e ainda mais desafiadora. Como é possível que ele permaneça no cargo? Continue lendo A desdemocratização e seu rastro

Viralatismo reverso, um vírus tabajara

Por Artur Araújo

Um país como o Brasil, com moeda soberana bastante estável há décadas, com mercado interno de grandes proporções, com razoável diversificação de parque produtivo, com abundância de insumos básicos, com fortes vantagens demográficas, territoriais e climáticas – e que só não transforma esses vetores em desenvolvimento com acelerada redução de desigualdades e clara orientação de sustentabilidade por força de travas ideológicas austericidas autoimpostas – é um país que tem que ser um dos líderes do novo arranjo do capitalismo que se esboça. Porque pode ser e porque precisa ser. Continue lendo Viralatismo reverso, um vírus tabajara

A guerra contra a ciência de Bolsonaro: estilhaçando o mito da Janela de Overton

Por Douglas Oliveira Donin

Nesta altura dos acontecimentos, o governo de Jair Bolsonaro – sobretudo o seu heterodoxo método de manejo da crise sanitária da Covid-19, marcado pelo desrespeito inflexível, incondicionado e inarredável à medicina baseada em evidências científicas – já não é um fator de perplexidade apenas nacional, mas um assunto que causa espanto ao globo. O Brasil, de uma longa lista de nações, alcançou o improvável feito de se destacar no último lugar em ranking que analisa reação de países à Covid-19, atrás de locais de lamentável performance humanitária[1], preocupa o mundo como um celeiro de novas variantes virais[2] e, como resultado, hoje nosso principal líder político é personagem legado ao imaginário mundial, catalisador de reações que vão do choque[3] à chacota[4]. Continue lendo A guerra contra a ciência de Bolsonaro: estilhaçando o mito da Janela de Overton