Bioenergia na agricultura

A indústria agrícola vem juntando esforços em direção à autonomia e à eletrificação, permitindo um agronegócio mais rentável e com emissão zero de carbono. Para que aconteça a transição energética no setor de maquinários agrícolas, o caminho continua sendo a aposta em diversas fontes renováveis de energia: biometano, biogás, diesel verde, diesel de cana ou outras fontes de biomassa, misturas ternárias (diesel, biodiesel – vegetal ou animal e álcool).

Bárbara Teruel e Daniel Zacher

A agricultura cresce a ritmo acelerado a cada ano, motivada pela maior demanda global por alimentos, biomassa e fibras vegetais, o que traz consigo o aumento da produção e uso de maquinários e implementos agrícolas. Dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq) indicaram em 2022 uma forte procura por máquinas agrícolas, que já vinha de um ciclo expressivo desde 2020, gerando aumento do faturamento de 25% entre 2020 e 2021. Dados do planejamento de exportação sobre o comércio mundial de máquinas agrícolas projetam crescimento 2023 e 2026 em quase 6%.

As perspectivas podem ser ainda maiores, considerando que foram anunciados quase R$ 341 bilhões em crédito rural para o período de 2022/23, o maior valor nominal ofertado em um Plano Safra. Esse crescimento é projetado também para o mercado global, sendo mais pronunciado na América Latina. Nos últimos anos, o Brasil se tornou o maior mercado global de colheitadeiras e plantadeiras, considerando todas as marcas, superando os Estados Unidos.

O aumento do mercado de vendas de maquinários agrícolas traz consigo a demanda por maior consumo de combustíveis, ainda predominantemente dependente dos de origem fóssil. A produção e consumo de biocombustíveis na agricultura estão atreladas a questões da sustentabilidade, sendo uma das alternativas a adoção de biocombustíveis que, em alguns casos, podem ser produzidos nas próprias fazendas ou propriedades rurais, substituindo total ou parcialmente combustíveis de origem fóssil.

No Brasil, o diesel é o combustível predominante utilizado em tratores, colhedoras e outras máquinas auto-propelidas, apesar de ter origem no mesmo óleo combustível fóssil. No varejo, não há venda de óleo diesel puro, e sim um blend de diesel com biodiesel, na proporção crescente determinada pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Espera-se que, a partir deste ano (2023), a concentração de biodiesel em mistura com o diesel puro passe dos atuais 12% (B12) para 15% (B15).

Biocombustíveis & diesel verde

Neutralizar as ações antrópicas ao meio ambiente e desacelerar mudanças climáticas através da transição energética têm sido pauta prioritária da sociedade civil, expressas pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas – ONU. Cresce a utilização de energia produzida a partir de resíduos orgânicos, seja vegetal, como cana, milho, cereais, dejetos orgânicos, e também óleos vegetais, ou seja, fontes de energia renovável – e a partir das quais podem ser gerados eletricidade, calor e combustíveis.

O termo diesel verde vem se tornando usual para denominar um combustível 100% renovável, produzido a partir do processamento de óleos vegetais como soja e palma, ou de gorduras animais. Ou seja, a matéria-prima pode ser tanto de origem vegetal como animal. Por ter a composição semelhante ao óleo diesel de origem fóssil, o diesel verde pode ser acrescentado ao diesel mineral em qualquer proporção, e até mesmo ser substituído de forma integral. Por ser um combustível que mantém as características, os motores não precisam ser alterados.

A exemplo do biodiesel, que atualmente é adicionado ao diesel mineral, surge a possibilidade de incluir um terceiro combustível, diversificando a oferta, como inclusive já prevê a resolução de 2021 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP (Resolução 842). Este marco regulatório inclui cinco opções de tecnologia de produção do denominado diesel verde, seja por hidrotratamento, síntese de gás proveniente de biomassa, fermentação ou oligomerização de álcoois.

O óleo vegetal hidrotratado (hydrotreated vegetable Oil – HVO) é o tipo de diesel verde mais produzido no mundo, por isso é frequentemente relacionado ao combustível. Também é o terceiro biocombustível mais consumido mundialmente, atrás apenas do etanol e do biodiesel. Dentre as vantagens do uso de diesel verde estão a preservação ambiental e diminuição da emissão de gases de efeito estufa, melhorando a qualidade do ar. Por se tratar de energia renovável e sustentável, ela pode ser produzida a partir de resíduos de baixo valor agregado e que seriam descartados no meio ambiente. Isso é uma oportunidade adicional, já que a matéria-prima para a produção do biocombustível não competiria com aquelas destinadas à alimentação humana ou animal. Trata-se de energia confiável, segura e eficiente, que motiva pesquisas e desenvolvimento tecnológico.

Outro viés está nos benefícios sociais, porque contribui com a geração de empregos e a diminuição do êxodo rural. Pelo lado econômico, o uso em maquinários agrícolas favorece a redução da quantidade de combustível de origem fóssil por hora de trabalho, que em uma jornada de oito horas pode chegar a mais de 100 litros consumidos.

Diminuição de impactos ambientais por redução de emissões de gases efeito estufa

Desde 2015, está em vigor no Brasil o Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) MAR-I, que estabelece limites de emissões. A primeira fase, para máquinas agrícolas, teve início em janeiro de 2017. A segunda, em janeiro de 2019, quando a legislação passou a ser válida também para equipamentos agrícolas e florestais.

Porém, embora venham ocorrendo investimentos em melhorias dos processos para se adequar aos limites estabelecidos pelo Proncove, como a recirculação de gases de escape, provocando menor quantidade de emissões de gases, isso ainda não é suficiente para conseguirmos de fato chegar na agricultura de baixo carbono. Trata-se de continuar avançando na produção e utilização de motores híbridos, aliando expertise em gás natural aos elétricos, uso de diferentes tipos de combustíveis, refletindo em menor consumo, maior eficiência e redução das emissões.

Alternativas

 As células de hidrogênio geram eletricidade com base em processos químicos que combinam hidrogênio e oxigênio. Essa alternativa vem ganhando espaço porque produz energia limpa, sem toxicidade e com quase nenhum impacto ambiental, pode ser transportada a longas distâncias (fase gasosa) ou armazenada em grandes quantidades (fase líquida), e usada como combustível em diversos tipos de motores.

No entanto, a limitação do uso de células de combustível está na obtenção do hidrogênio, que não é encontrado de forma livre na Terra, tendo que ser produzido a partir de gás natural, etanol ou metanol, biogás ou processo de eletrólise. Um exemplo seria a unidade HGS (hydrogen generating system) presente em alguns caminhões ou ônibus. Nela, há um depósito com água destilada que vai se convertendo em hidrogênio mediante eletrólise. Nesses veículos o hidrogênio, misturado com o ar, é injetado no motor, fazendo a combustão com o óleo diesel, podendo fazer 5 mil km ou 100 horas de trabalho com apenas dois litros de água. A vantagem é uma combustão mais potente e uma marcante redução do consumo de combustível fóssil ou verde.

A indústria agrícola vem juntando esforços em direção à autonomia e à eletrificação nos próximos anos, permitindo um agronegócio mais rentável e com emissão zero de carbono. Para que aconteça a transição energética no setor de maquinários agrícolas, o caminho continua sendo a aposta em diversas fontes renováveis de energia: biometano, biogás, diesel verde, diesel de cana ou outras fontes de biomassa, misturas ternárias (diesel, biodiesel – vegetal ou animal e álcool). Assim, haverá redução das emissões do maquinário, aliado ao reaproveitamento de resíduos de descartes. E, com isso, motores de combustão interna que incorporem soluções híbridas, contando com fontes auxiliares, como a elétrica.

Bárbara Teruel é pesquisadora do Eixo VI do CPTEn – http://lattes.cnpq.br/1175445863697842
Daniel Zacher  é pesquisador do Eixo VI do CPTEn –  http://lattes.cnpq.br/7490372464056298

Referências
https://epbr.com.br/o-que-e-diesel-verde-e-o-que-esta-em-disputa-no-mercado-brasileiro-de-biocombustiveis/
https://agencia.fapesp.br/biocombustiveis-sao-cruciais-para-a-transicao-energetica-mas-e-preciso-vencer-a-desinformacao/41811/
https://www.comciencia.br/transicao-energetica-desafios-e-oportunidades/
https://blog.jacto.com.br/bioenergia/
https://www.movenews.com.br/2022/11/11/maquinas-agricolas-alta-demanda-no-mercado-mundial/
https://portalmaquinasagricolas.com.br/a-evolucao-dos-motores-em-maquinas-agricolas/
https://www.agrolink.com.br/noticias/maquinas-agricolas–alta-demanda-no-mercado-mundial_472666.html
https://peteaa.wixsite.com/pet-eaa/single-post/2017/01/04/demanda-de-energia-em-tratores-agr%C3%ADcolas
https://unapel.com.br/blog-biocombustiveis-atividades-agricolas/
https://www.agro.bayer.com.br/