Fabrício Marques é editor de política científica e tecnológica da revista Pesquisa FAPESP
Como tem sido sua trajetória profissional e como foi seu envolvimento com jornalismo de ciência?
Meu primeiro emprego foi na revista Veja, em 1986. Trabalhei lá sete anos como repórter e depois editor de Geral. Fazia de tudo (até matérias de comportamento e religião), mas meu foco principal era medicina e educação. A primeira entrevista de páginas amarelas que fiz foi com o geneticista Crodowaldo Pavan (o título era “A pesquisa nos salvará”), à época presidente do CNPq. Depois trabalhei na sucursal do Jornal do Brasil em São Paulo, onde cobria de tudo, mas tinha a incumbência de acompanhar o que acontecia nas universidades paulistas. Em 1998, ingressei na equipe que criou a revista Época. A princípio editava a seção de abertura da revista, mas depois de um ano substituí a Martha San Juan França como editor de ciência e tecnologia. Saindo da Época, fui para a Pesquisa FAPESP, onde estou até hoje. Edito a seção de Política Científica e Tecnológico e faço o podcast da revista, onde entrevisto três pesquisadores toda semana. Paralelamente, fiz mestrado e trabalhei por alguns anos como professor de um curso de jornalismo que não existe mais, nas Faculdades de Campinas (Facamp).
Quais seriam os principais defeitos, ou mazelas ou carências do jornalismo científico praticado hoje no Brasil em sua opinião?
A cobertura de ciência nunca teve muito espaço na imprensa tradicional e nos últimos anos vem perdendo o pouco fôlego que tinha. Temas científicos, em geral, são vistos como áridos por grande parte do público, o que se deve, a meu ver, ao baixo nível de letramento. Os veículos só se empolgam um pouco mais com temas de fácil entendimento, como vacinas e foguetes, mas a abordagem tende a ser superficial.
Na minha avaliação, o principal desafio do jornalismo é mostrar ao público que temas científicos são importantes, que compreendê-los pode não ser simples, mas que isso abre novas janelas para o mundo. Vejo, em geral, despreparo para cumprir essa tarefa.
Entre jornalistas não especializados, falta formação. Nem estou falando de especialização, às vezes falta formação de nível de ensino médio. Boa parte da resistência das fontes em conversar com jornalistas vem disso – todos têm uma experiência ruim, em que foram entrevistados por repórteres que não entenderam nada e escreveram alguma barbaridade.
Já entre os jornalistas especializados, vejo uma tendência de falar para os já convertidos e de escrever de modo muito pouco atraente para jovens e para o público leigo. É curioso ver como esse tipo de trabalho hoje é feito com mais eficiência por um divulgador de ciência com formação acadêmica como o Átila Iamarino do que por jornalistas.
Caso você tivesse um semestre para ministrar uma oficina de jornalismo científico, qual seria seu foco ou prioridade na formação dos futuros jornalistas de ciência?
Não tenho uma receita pronta, mas exercitaria a habilidade de ouvir o que o pesquisador tem a dizer e de entender a importância e a essência do trabalho dele – para em seguida propor maneiras atraentes e compreensíveis de apresentar aquele resultado/conteúdo a um público que sabe muito pouco sobre aquilo.
Pode parecer óbvio, mas um jornalista precisa compreender o assunto sobre o qual vai escrever para poder traduzi-lo para o público – e isso nem sempre acontece. Inteirar-se sobre o assunto antes de fazer uma entrevista é uma obrigação – e ajuda a criar empatia com os entrevistados e a fazer as perguntas certas.
Já em relação à escrita, o principal desafio talvez seja se colocar no lugar do leitor para identificar aspectos de seu perfil e de sua experiência que tenham algum elo com aquele conteúdo, a fim de despertar interesse. Explicar de modo didático, modulando a informação para o nível de formação do leitor, e humanizar o texto, mostrando os desafios que o pesquisador enfrentou e o que ele aprendeu ao longo do processo, também ajudam a estabelecer um vínculo com o leitor.