Por Heloísa M. Buttini/ Especial da Editora da Unicamp
O objeto de estudo da autora é como se deu a divulgação das músicas que transcenderam o contexto da escravidão e se tornaram mercadoria nos palcos do mundo, com todas as contradições que se constituíram durante o processo.
O trajeto percorrido dentro do campo musical entre as senzalas e os palcos, do final do século XIX ao início do século XX, é delineado no terceiro volume da Coleção Históri@ Illustrada da Editora da Unicamp.
Da senzala ao palco: canções escravas e racismo nas Américas, 1870-1930, de Martha Abreu, segue a linha dos dois volumes anteriores e conta com intertextos que propiciam uma leitura fluida e dinâmica mesmo aos leitores que não são especialistas no assunto. A plataforma digital permite que a narrativa da autora seja entremeada com as canções que são discutidas no livro, de forma que texto e música se complementam na narrativa, indo além tanto do registro escrito quanto do campo sonoro.
A autora, professora titular do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense (UFF best hunting crossbow), afirma que o livro é, em grande medida, fruto de seu aprendizado sobre o racismo no campo cultural. Aprendizado esse dificultado “para quem cresceu embalada pelas lendas da suposta democracia racial brasileira”. Em sua tentativa de compreensão do preconceito e na desvinculação das noções ilusórias de igualdade, ela faz questionamentos a respeito de como as músicas produzidas por escravos nas senzalas das Américas, principalmente dos Estados Unidos e do Brasil, se inseriram dentro dos teatros de revista, das capas de partituras e da própria indústria fonográfica.
A partir de sua introdução nesses novos ambientes, Martha Abreu destaca o surgimento de movimentos que contribuíram para a reprodução de uma série de estereótipos racistas, mas que, paralelamente, também permitiram a visibilidade de músicos negros que ressignificaram estigmas no campo musical, dando destaque para Eduardo das Neves e para o norte-americano Bert Williams.
A temática do livro não se estende tanto aos gêneros musicais – como cakewalks, lundus e jongos – e sua análise estética. O objeto de estudo da autora é como se deu a divulgação dessas músicas, que transcenderam o contexto da escravidão e se tornaram mercadoria nos palcos do mundo, com todas as contradições que se constituíram durante o processo.
O livro é dividido em duas partes: “Trânsitos no Atlântico negro” e “Uma história da canção escrava no Brasil”. Na primeira, o objetivo é ressaltar o conhecimento tanto dos músicos quanto do público brasileiros das canções escravas vindas dos Estados Unidos e de sua participação no chamado “Atlântico negro”, responsáveis pelos trânsitos culturais entre o norte e o sul do continente americano.
Na segunda parte, ainda sob o viés transnacional, os capítulos acompanham o histórico das canções escravas dentro do território brasileiro, de meados do século XIX até as duas primeiras décadas do século XX.
Da senzala ao palco: canções escravas e racismo nas Américas, 1870-1930
Autora: Martha Abreu
Editora da Unicamp
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