Sete em cada dez profissionais de saúde pública não se sente preparado para lidar com a pandemia

Por
   Ana Carolina Bezerra da Silva
   Júlia Ramos

Apenas um em cada três profissionais de saúde pública foi testado para Covid-19, metade não recebeu equipamentos de Proteção Individual (EPI) e 70% deles não se sentem preparados para lidar com a Covid-19. Os resultados foram divulgados pelo Núcleo de Estudos da Burocracia (NEB) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no dia 30 de julho na segunda fase da pesquisa “A pandemia de Covid-19 e os profissionais de saúde pública no Brasil”.

A pesquisa mostra também que, apesar de 78% dos profissionais relatarem que que sua saúde mental foi afetada, apenas 20% recebeu algum tipo de apoio. Esse é o caso de Helena*, médica residente em um grande hospital da cidade de São Paulo. “Recebi pouco treinamento. Apenas o básico sobre paramentação e desparamentação no atendimento a casos suspeitos de Covid-19. Não recebi treinamento sobre como manejar clinicamente os pacientes”, diz em entrevista à reportagem.

Apesar da situação não ser favorável em nenhuma região do país, Norte e Nordeste têm as piores condições de trabalho e que os Agentes de Controle de Endemia (ACE) e Agente Comunitário de Saúde (ACS) são os profissionais em situação de maior vulnerabilidade.

Realizada entre os dias 15 de junho e 1º de julho, a pesquisa usou um formulário online para coletar impressões de 2.138 profissionais de todos os níveis de atenção e de todas as Unidades Federativas do Brasil e procurou medir a percepção desses profissionais sobre o avanço da pandemia, saúde mental, assédio moral e testagem.

A pesquisa foi distribuída por compartilhamento de links das redes sociais e aplicativos de troca de mensagens. Os resultados trazem a opinião dos respondentes e não podem ser generalizados para todos os profissionais de saúde pública do país. “Os dados, no entanto, trazem um bom retrato do que pensam os profissionais que estão na linha de frente do combate à pandemia por meio dos respondentes”, disse a coordenadora do trabalho, Gabriela Lotta, no lançamento da pesquisa.

Com uma média nacional de 1,4 leito de UTI no sistema público de saúde para cada 10 mil habitantes e 70% da população dependente do SUS, a distribuição de EPIs e a testagem dos profissionais são necessárias para proteger tanto a população quanto os profissionais. Segundo Gabriela Lotta, uma das responsáveis pela pesquisa, a testagem de profissionais é uma forma de impedir que eles se tornem vetores da doença e contaminem pacientes ou colegas de trabalho.

De acordo com dados do Ministério da Saúde divulgados no dia 05 de agosto, existem 233.912 casos confirmados e 169 mortes entre os profissionais da saúde. Os mais afetados foram os profissionais da enfermagem com 114.009 casos confirmados, seguidos pelos médicos (25.207 casos confirmados) e agentes comunitários de saúde (11.346 casos confirmados). “Conheço facilmente mais de 40 pessoas que ficaram doentes. Pais, irmãos, amigos e colegas de trabalho. […] o hospital aqui é bem grande, muita gente se contaminou”, conta Helena.

O Projeto de Lei 1826/2020, surgiu como forma de oferecer “um mínimo de segurança financeira e direitos para poder exercer sua atividade com um mínimo de amparo do governo”, de acordo com o próprio documento. O PL prevê indenização à profissionais que se infectaram com o novo coronavírus atuando no combate à pandemia e ficaram permanentemente incapacitados. O projeto também garante indenização aos cônjuges, dependentes e herdeiros do trabalhador de saúde que tivesse falecido por ter atuado diretamente no atendimento de pacientes da doença ou em visitas domiciliares.

Apesar de ter sido aprovado pelo Congresso em 14 de julho, o PL foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro. Ainda assim, o Congresso pode decidir se derruba ou mantém o veto em uma sessão conjunta a ser agendada. Se for derrubado, a lei seguirá para promulgação.

*a entrevistada pediu anonimato.