CARTA AO LEITORNOTÍCIASENTREVISTASREPORTAGENSRESENHASCRÍTICA DA MÍDIALINKS DE C&TCADASTRE-SE NA REVISTABUSCA POR PALAVRA-CHAVECARTA AO LEITORNOTÍCIASENTREVISTASREPORTAGENSRESENHASCRÍTICA DA MÍDIALINKS DE C&TCADASTRE-SE NA REVISTABUSCA POR PALAVRA-CHAVE
 

Resenhas

Desenvolvimento, trabalho e solidariedade
Márcio Pochmann (org.)

Trabalho infantil em Campinas
Geraldo Di Giovanni (Coord.)

Outras resenhas

Envie sua resenha
rae@unicamp.br


 

Trabalho infantil em Campinas
Geraldo Di Giovanni (Coord.)
Editora Unicamp/Instituto de Economia/Nepp, 2002


por Simone Pallone

O trabalho infantil é um dos sérios problemas no Brasil. Há desde crianças trabalhando em serviços domésticos até crianças que trabalham em carvoarias, no tráfico de drogas ou prostituindo-se. Quase sempre atividades degradantes e de pouca remuneração. Mas o que leva essas crianças e adolescentes ao trabalho? Através de um convênio com a Secretaria Municipal de Assistência Social da Prefeitura Municipal de Campinas, o Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (Nepp), da Unicamp, realizou uma pesquisa na qual procurou-se estudar um grupo de crianças e adolescentes que trabalham no centro de Campinas. Esse estudo foi transformado no livro Trabalho infantil em Campinas, coordenado pelo professor do Instituto de Economia da Unicamp, Geraldo Di Giovanni, lançado em setembro, pela Editora da Unicamp.

O objetivo da pesquisa não foi retratar todas as formas de trabalho infanto-juvenil do município. Procurou sim avaliar o trabalho dessas crianças e adolescentes nas ruas, o que é uma das modalidades de trabalho infantil. O livro traça o perfil dessas crianças, de suas famílias, do tipo de trabalho que é realizado nos cruzamentos de ruas da área central e nas feiras livres. Além disso, traz também uma avaliação da falta de eficácia das políticas públicas que deveriam pôr fim a essa situação e apresenta algumas propostas de como acabar ou ao menos minimizar o trabalho infantil nas ruas, o que só é possível reduzindo-se as desigualdades e a exclusão social.

A primeira parte do livro traz o perfil das crianças que trabalham nas ruas de Campinas, quais são as atividades, como é a organização desse trabalho e por quem é feita. Apresenta também as razões pelas quais as crianças trabalham nas ruas, se gostam ou não do trabalho, quais as diferenças de escolhas entre meninos e meninas, a diversidade de motivos que os levam para tal atividade, número de horas que trabalham, renda média diária, entre outros detalhes.

Os pesquisadores entrevistaram 252 crianças, das quais 81 não residem em Campinas, morando em cidades vizinhas como Hortolândia, Sumaré, Monte Mor e Indaiatuba, e vêm para Campinas apenas para trabalhar nas ruas, voltando para casa no final do dia. Mas a pesquisa concentrou-se mais no público infanto-juvenil residente em Campinas.

Alguns resultados da pesquisa, desmistificaram suposições como a de que na organização do trabalho há terceiros que exploram o trabalho das crianças, e de que as crianças não têm família ou vêm de famílias desestruturadas. O que se observou foi que a maioria trabalha na rua de forma independente, e eles próprios se organizam, quando isso não é feito por algum parente. As crianças e adolescentes escolhem o local onde vão trabalhar, preferindo os cruzamentos de mais movimento, locais que consideram mais seguros, e onde comerciantes e policiais permitem a presença deles. Em relação às famílias, a grande maioria pertence a famílias de estrutura tradicional, convivendo com pai, mãe e irmãos.

Rendimento
O que leva essas crianças e adolescentes a trabalhar nas ruas é a necessidade de aumentar a renda familiar. Mesmo que alguns deles, principalmente os meninos, não repassem todo o dinheiro para os pais, 15% deles contribui com mais de 50% do orçamento familiar. O ganho médio diário da maioria das crianças entrevistadas é de R$ 6,00 a R$ 10,00 e a falta de trabalho dos pais e mesmo o rendimento baixo dos que estão ocupados, é a principal razão que faz com que esses menores tenham que vender balas, entregar panfletos, engraxar sapatos, montar e desmontar barracas nas feiras, carregar sacolas e carrinhos, guardar carros, ou outras atividades.

Mais que um terço das famílias entrevistadas sobrevive com R$ 90,00 por mês. Com renda per capita entre meio e um salário mínimo (na época da pesquisa, em 2001, o valor do salário mínimo era de R$ 180,00), estão 42,5% das famílias entrevistadas. Entre os pais, que tiveram o perfil traçado na segunda parte do livro, apenas 25% têm relações assalariadas formalizadas e 31% deles são desempregados com ou sem ocupação temporária. Ou seja, é para melhorar as condições da sobrevivência da família que as crianças ficam muitas vezes em média 5 horas na rua, podendo chegar até mais de 10 horas.

A maioria dessas crianças freqüenta a escola em um período, mas muitos tiveram que abandonar para ficar trabalhando por mais tempo, por falta de vagas ou porque a violência na escola os afastou.

Em relação ao sexo, a grande maioria é de meninos. Muitas meninas assumem as responsabilidades na própria casa, cuidando das tarefas ou de irmãos mais novos. Das 171 crianças que residem em Campinas, 140 são meninos e apenas 31 meninas. Mais do que os meninos, as crianças e adolescentes do sexo feminino, afirmaram que prefeririam ter outra atividade, mas que não têm outro emprego e como precisam colaborar com a renda familiar só lhes resta trabalhar nas ruas.

Os dados apresentados no livro nos levam a crer que as políticas públicas que deveriam dar conta do desemprego, da baixa renda das famílias do município, que deveriam proteger esses menores sob o teto de suas casas, de creches, ou de escolas, ou mesmo ao ar livre praticando atividades esportivas os simplesmente brincando, não estão sendo eficazes.

Os pesquisadores apontam algumas medidas que poderiam reduzir a desigualdade e a exclusão social, ações que implicam em maior articulação dos órgãos públicos que atuam com crianças que trabalham nas ruas, na integração das políticas sociais nas três instâncias de governo, em investimentos para redução da desigualdade de condições de vida nos bairros: infra-estrutura de lazer, atividades educacionais e formativas, ampliação da abrangência de atendimento dos serviços de apoio à família, à criança e ao adolescente, como creches, escolas, postos de saúde e espaços de convivência comunitária, integração de programas que objetivam complementação e geração de renda no município, entre outras.

O livro não esgota o assunto, mas traz dados suficientes que mostram que a partir da década de 80 a pobreza passa a ser um problema no município de Campinas, e que na verdade é um retrato do que vem ocorrendo em todo o país. Vale ressaltar que a pesquisa, como destacam os autores, "constitui uma oportunidade de conhecer um segmento do trabalho infantil pouco estudado, que se torna relevante em decorrência da urbanização da pobreza no país, um processo que se manifesta a partir dos anos 80". Os autores lembram também que um indicador de que a pobreza urbana constitui-se um problema que precisa ser melhor equacionado foi a ampliação do Peti, um programa instituído em 1996 para combater a pobreza e proteger as crianças e adolescentes submetidos a riscos em decorrência de trabalhos penosos na atividade agrária e agro-industrial. A partir do ano 2000, o programa foi ampliado para as áreas urbanas, com o objetivo de tirar as crianças e adolescentes de atividades de risco nos lixões, no comércio em feiras livres, em comércio de alimentos e outros produtos e principalmente em atividades como prostituição e comércio de drogas. Mas o quadro traçado de Campinas, mostra que ainda há muito o que fazer para se atingir tal objetivo.

Atualizado em 10/10/02
http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

2002
SBPC/Labjor

Brasil