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Resenhas


Seca e poder, entrevista com Celso Furtado
Editora Perseu Abramo

Įgua e desenvolvimento sustentįvel no Nordeste
Organizado por Vicente P.P.B. Vieira

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Įgua e desenvolvimento sustentįvel no Nordeste

Organizado por Vicente P.P.B. Vieira,
Ipea, 2000

Por Germana Barata

“O desenvolvimento econômico na região do semi-árido e do Nordeste sempre foi almejado e a dificuldade de alcançá-lo tem sido, freqüentemente, atribuída à escassez de água, o que, se por um lado, simplifica o problema, por outro imuniza os governantes de tentarem solucioná-lo em outras frentes. Dentro dessa linha de ação está o projeto da transposição do Rio São Francisco, em vias de se concretizar, como panacéia para os problemas da seca. Embora a solução esteja longe de ser consenso, fica clara a importância de se gerir os recursos hídricos disponíveis de forma integrada, planejada em longo prazo e baseada no desenvolvimento sustentável, para que os investimentos possam ser otimizados para garantir acesso universal a esse recurso que já foi tido como inesgotável.

Escrito há cinco anos por uma equipe do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), Água e desenvolvimento sustentável no Nordeste oferece ao leitor uma série de elementos essenciais, como a quantificação de indicadores, para diagnosticar, projetar e administrar esse recurso vital e em acelerado processo de degradação. A obra, publicada inicialmente em 1995, revela um panorama preocupante, que pede a determinação de diretrizes e critérios para o estabelecimento de novas políticas de gestão. Ao longo de suas 264 páginas, as análises sinalizam apoio às obras de transposição de bacias hidrográficas com disponibilidade de recursos para aquelas onde há escassez.

Os estudos, inicialmente feitos pelo Ipea para o Projeto Áridas (1994), foram embasados, sobretudo, em informações contidas no Plano Integrado de Recursos Hídricos do Desenvolvimento do Nordeste (PLIRHINE), elaborado pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) nos anos 1980. Os resultados de projetos, programas e planos de ação, do papel à execução, também alimentaram a análise e contribuíram para um breve histórico de inúmeras tentativas de aumentar a oferta de água, diante da crescente demanda. A área considerada no livro abrange os estados nordestinos e a região do semi-árido, dividida em 24 Unidades de Planejamento (UP) que incluem parte de Minas Gerais e exclui o Maranhão.

Embora a nova edição tenha atualizado o conhecimento, a maior parte dos dados utilizados, incluindo os da população do Nordeste e do semi-árido, é de levantamentos realizados em 1991, o que revela a fragilidade das pesquisas no setor, fato que é pontuado pelos autores também em relação a informações sistemáticas existentes sobre a complexidade e heterogeneidade dos problemas hídricos. O fortalecimento dessa área deveria ser o primeiro ponto a ser atacado em um esforço conjunto dos governos federal, estaduais e municipais. Conhecer para solucionar. Ao que parece, as inúmeras tentativas de minimizar os efeitos da seca foram sempre voltadas para eventos críticos temporários ou descontinuados pelas gestões políticas posteriores. O resultado é que, apesar dos açudes – como os 676 construídos pelo Departamento Nacional de Obras contra Secas (DNOCS) até 2000 – poços, cisternas, reservatórios – a exemplo das tentativas do Projeto Chapéu de Couro do governo de Sergipe – e áreas irrigadas – impulsionadas pelo Programa de Irrigação do Nordeste (Proine) –, terem melhorado as carências por recurso hídrico, não livraram a população de seus impactos.

Assim, os embates da gestão de água no Nordeste e na região do semi-árido vão além de aumentar a oferta da água, como já dizia o economista Celso Furtado (###fazer link para a resenha da Marta###), devem, sim, garantir que a população possa acessar e desfrutar de seus benefícios, questão que, embora brevemente mencionada no livro, passa pela justa distribuição de terras, maior oferta de emprego, saneamento básico, educação, linhas de crédito agrícola, entre outros. Condições estas que permitiriam à população conviver com as estações secas – que duram em média seis meses ao ano.

Nos últimos 100 anos a política de recursos hídricos tem privilegiado a oferta de água, em detrimento de seu aproveitamento racional. Pensando apenas em oferta e demanda o cenário já aponta para uma diminuição da disponibilidade da água. Quando a qualidade do recurso é levada em conta, esse quadro fica ainda mais dramático, se agravando com as negligentes ações humanas que descartam resíduos domésticos e industriais nos leitos dos rios, desmatam a vegetação ao redor das bacias, o que acelera a erosão e aumenta a impermeabilidade do solo, agrava o efeito da evaporação e, conseqüentemente, da seca.

O histórico das secas indica vários episódios na região, como as de 1990 a 1993, em que foi preciso providenciar a construção de um canal de 115 km de extensão saindo do Rio Jaguaribe (CE) para abastecer Fortaleza. Ou a de 1979 até 1983, que acelerou a migração da população rural para áreas urbanas, contribuindo para aumentar a demanda por água e agravando ainda mais a qualidade do recurso. Novos períodos de seca drástica não estão descartados.

A publicação do Ipea, previu as condições de uso da água em três cenários futuros (2000, 2010 e 2020), inclusive supondo a elevação da temperatura, causada por mudanças climáticas. Em todos eles, é unânime que a situação nas Unidades de Planejamento piora, resultando em demanda reprimida ou em uma situação crítica. A região que abriga a cidade de Recife sinaliza para a urgência de se aumentar a disponibilidade de água para atender a demanda, pois a bacia oriental de Pernambuco sofre da pior condição de sustentabilidade de seus recursos o que poderá, segundo os autores do livro, restringir o desenvolvimento sócio-econômico local. A bacia do Rio São Francisco, detentora de quase 67% da água de superfície disponível no Nordeste, aparece como o local onde ocorrerão os principais conflitos pelo uso da água. Entre eles estão os interesses voltados para a irrigação (a maior consumidora do recurso) e para a geração de energia elétrica, uma vez que o aumento do uso de água para a primeira resultaria em perda de energia nas cascatas, para a segunda.

Não se trata de uma leitura prazerosa nem, tampouco, de assimilação fácil dos dados que fornece. Faltam mapas para que o leitor possa identificar tanto a correspondência das UPs com as fronteiras dos estados, quanto os rios e bacias envolvidos nas propostas de transposição do São Francisco, reservadas ao anexo final da obra. Os inúmeros gráficos e tabelas são ricos em informações, mas pecam pela análise, ausente ou rasa, o que limita seu total desfrute a um público mais especializado, capaz de analisar os números por si só. Mas, certamente, seu conteúdo é de grande relevância para os gestores e especialistas em recursos hídricos, que devem considerar os conceitos e índices para medir a vulnerabilidade e desenvolvimento sustentável de uma região, mudando uma abordagem mais imediatista para outra que exige projeções futuras.

“As características físicas e climáticas do Nordeste semi-árido fazem que a presença da açudagem seja condição sine qua non para a habitabilidade da região”, enfatizam os pesquisadores do Ipea. Mas a isso, deve-se complementar com recursos para usos mais nobres vindos de mananciais subterrâneos – pouco estudados, embora freqüentemente explorados –, fortalecer a formação de recursos humanos que possam desenvolver técnicas de perfurações, dessalinização, reconhecimento de reservatórios, implementar a legislação no setor, o zoneamento econômico-ecológico, associado à política de ocupação e uso do solo, no controle e conservação dos recursos hídricos. Há muito que fazer.

Atualizado em 10/02/2005

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