Rússia ratifica Protocolo de Quioto
em troca de apoio europeu
"Não é uma decisão que tomamos com prazer. É uma decisão obrigada, política". Andrei Illarionov, conselheiro para economia do presidente russo Vladimir Putin, comentou assim um dos eventos centrais deste mês, a assinatura russa do Protocolo de Quioto. Contra a vontade de muitos parlamentares russos, Putin manteve sua promessa. A Rússia, em troca do apoio europeu para o ingresso na Organização Mundial do Comércio (OMC), ratificou no início de novembro o Protocolo de Quioto, o acordo mundial para limitar a emissão na atmosfera de gases que contribuem para o efeito estufa.
"A assinatura russa é fruto de uma troca planejada", comenta Franco Foresta Martin, geólogo e jornalista científico e ambiental do Corriere della Sera (o maior jornal diário italiano). "Depois da marcha a ré dos Estados Unidos, o Protocolo estava condenado a morte. Para salvá-lo, vários líderes da Comissão Européia intervieram em busca da adesão da Rússia. Sem este país, a implementação seria impossível", afirma. A adesão de Moscou ao protocolo - proposto em dezembro de 1997 no Japão e cuja ratificação vêm sendo negociada há 12 anos - era fundamental para que este entrasse em vigor. O tratado afirma que os países participantes não estão comprometidos em atuar em políticas de redução das emissões, enquanto não houver a inclusão de países que representem pelo menos 55% das emissões mundiais de dióxido de carbono (cuja emissão representa a principal contribuição humana ao efeito estufa). Até agora, o Protocolo, apesar de ter sido assinado por 126 nações, chegava a incluir somente os responsáveis por 44% das emissões, faltando os três maiores produtores de gases estufa do planeta: os EUA, a China e a Rússia, respectivamente, responsáveis por quase metade de todo o dióxido de carbono emitido no mundo.
Putin tinha prometido a adesão ao tratado em maio passado, logo depois que a União Européia assinara seu apoio para o ingresso da Rússia na Organização Mundial do Comércio. "A União Européia nos ajudou", declarou oficialmente o presidente, "e este fato não pode deixar de influenciar positivamente nossa posição a respeito do Protocolo de Quioto".
O protocolo prevê que a emissão ligada à atividade humana de seis gases que contribuem para o efeito estufa (entre eles, o dióxido de carbono e o metano) seja reduzida, entre 2008 e 2012, em pelo menos 5,2%, em média, em comparação com a emissão medida em 1990. A redução imposta, porém, não é a mesma para todos os países: os que poluem mais, ou que são mais industrializados, se comprometeram a reduzir ainda mais as emissões, enquanto alguns países em desenvolvimento estarão autorizados a aumentar suas emissões. A Rússia, por estar numa situação de profunda reestruturação econômica, está autorizada a não reduzir as emissões de carbono, mas fica comprometida a não aumentá-las. Apesar disso, numerosos políticos russos acreditam que a adesão ao tratado será prejudicial ao crescimento econômico do país.
"Nesta primeira fase, o impacto da atuação do Protocolo sobre o clima mundial será provavelmente irrelevante", explica Foresta Martin. "Robert Watson, que liderou o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), afirma que, para salvar o sistema climático, a redução em 5% nas emissões de gases estufa não adianta: seria indispensável eliminar 60% das emissões ao longo deste século, com a participação ativa dos EUA e de vários países do hemisfério sul, além de China e Índia, que já estão contribuindo ou vão contribuir de forma significativa". Infelizmente, como mostra a grande maioria das pesquisas efetuadas no último ano, o planeta continuará aquecendo nas próximas décadas, com conseqüências extremamente graves, mas ainda não totalmente conhecidas, para os ecossistemas e a vida humana. Apesar disso, a entrada da Rússia no tratado foi recebida como uma notícia extremamente positiva por muitos comentaristas e cientistas. "O impacto político da assinatura russa", diz Foresta Martin, que é especialista em tratados ambientais internacionais, "consiste na grande vitória da política ambiental européia sobre a política anti-Quioto dos EUA. Agora, na questão climática, eles estão isolados. Com certeza, outros países menores irão aderir ao tratado".
A
esperança de muitos é que a comunidade internacional
consiga logo formular políticas mais ambiciosas ainda, com
investimentos maciços para favorecer cortes substanciais
nas emissões e para tentar atenuar os prejuízos sociais
e ambientais nas áreas mais afetadas pelo aquecimento. "Na
verdade", conclui o jornalista ambiental, "a atuação
prática do controle das emissões já começou
em muitos países, na forma de programas de melhoramento da
eficiência energética em vários setores, de
incremento das fontes renováveis e de assistência a
países em desenvolvimento. Mas conseguir as cotas de redução
das emissões previstas pelo tratado até 2012 será
dificílimo para muitos países (como a Itália).
Estamos apenas no início. Mas a jornada tinha que começar".
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Agências
dos EUA reconhecem efeito estufa, mas Bush não ratifica Quioto
(ComCiência)
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Íntegra do texto do Protocolo de Quioto à Convenção
do Clima (Ministério de Ciência e Tecnologia)