Medidas deverão impulsionar participação de mulheres na ciência
Às vésperas do governo divulgar o Plano Nacional de
Políticas para as Mulheres, terminou hoje o encontro de Mulheres
Latino-Americanas nas Ciências Exatas e da Vida, no Rio de
Janeiro. O evento reuniu, pela primeira vez, cientistas preocupadas
com sua reduzida participação em disciplinas ainda
consideradas masculinas, como a física e a matemática.
A ministra para assuntos da mulher, Nilcéia Freire, recém
eleita presidente da Comissão Interamericana de Mulheres,
adiantou que na primeira semana de dezembro as mulheres ganharão
com a ampliação da educação pré-escolar
infantil, alfabetização de adultos e extensão
do período para o tempo de titulação.
A ínfima presença de homens no evento (cerca de quatro, apenas durante a abertura), embora lamentada, não impediu que as cerca de 100 mulheres presentes analisassem sua situação perante a academia. "Mais do que ampliar esta participação, minha preocupação é em qualificar a participação das mulheres na ciência", afirmou Freire, que chamou atenção para o fato da exclusão feminina ser tão sutil e sofisticada que muitas vezes não é perceptível pelo próprio grupo excluído.
Embora sejam maioria na educação superior, como foi divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) neste ano - cerca de 56,3% do total de matrículas e 62,4% daqueles que concluem o ensino universitário - é consenso entre as cientistas que existe uma estrutura em pirâmide que impede que as mulheres estejam no topo hierárquico de suas carreiras. "As mulheres têm chances menores de sucesso e ascensão na carreira: são menos contempladas com bolsas de produtividade do CNPq, estão sub-representadas nos cargos administrativos da UFRJ e entre os acadêmicos da Academia Brasileira de Ciências", concluiu Jacqueline Leta, bioquímica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em artigo publicado no periódico científico Estudos Avançados, no ano passado. "Somos boas vice-presidentes, vice-diretoras e vice-reitoras, mas nunca as titulares", lamentou Liliam Alvarez Diaz, representante da Third World Academy, de Cuba.
Apesar da aparente neutralidade da ciência, as cientistas alegam que seus pedidos de bolsas e auxílios à pesquisa sejam mais freqüentemente negados do que o de homens, o que dificultaria sua progressão na profissão. De forma semelhante, ocorreria no meio político. A tendência de mudança nesse quadro é lenta, segundo afirmou Nilcéia Freire, em função da longa trajetória dentro das carreiras e das fortes hierarquias de poder, dominadas e mantidas por homens. No Brasil, apenas 12,5% dos vereadores são mulheres e 7,5% são prefeitas. As suposições esbarram em lacunas presentes no campo de estudos de gênero, onde há dificuldade de acesso a dados públicos, alegaram as participantes, precariedade de bancos de dados existentes e a impossibilidade de se fazer cruzamentos por categorias, como se pode fazer no IBGE. Como medida urgente, foi mencionado o levantamento estatístico da demanda de mulheres cientistas em relação à aprovação de pedidos de auxílio à pesquisa.
Ações
afirmativas
Rosana Santiago, física da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), declarou ser fundamental se pensar na possibilidade do auxílio maternidade ser recebido pelas mulheres durante o período de recebimento de bolsas de pós-graduação, o que, segundo ela, motivaria a qualificação feminina. Seu depoimento partiu de sua dificuldade em ter optado pela maternidade durante o período de seu doutorado. A experiência de Santiago repete a de inúmeras cientistas, que durante sua qualificação profissional, são consideradas estudantes perante a lei trabalhista. "Devemos ter [como pesquisadoras] os mesmos direitos de qualquer trabalhador", concordou Solange Cavalcanti, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
As
propostas, embora ainda não discutidas dentro do Plano Nacional
de Políticas para as Mulheres, serão levadas à
discussão dentro do governo, garantiu a ministra. De concreto,
há a ampliação da educação pré-escolar
infantil (leia notícia)
para que as mulheres "possam compartilhar de outros espaços
públicos, sem os impedimentos da maternidade", além
da diminuição do contingente de analfabetismo entre
adultas acima de 45 anos e a extensão do período de
titulação, de maneira a facilitar a qualificação
profissional.
Parcerias
Seguindo o exemplo brasileiro, 2005 foi declarado o ano das mulheres
latino-americanas, que vivem sob condições bastante
semelhante, segundo ficou demonstrado pelas participantes do evento,
vindas do México, Argentina, Uruguai e Cuba. A idéia
agora será ampliar o acesso a bancos de dados dos países
parceiros para a construção de indicadores que permitam
um diagnóstico mais claro da situação da de
gêneros na ciência e que venham a subsidiar políticas
públicas que possam equilibrar melhor o cenário. "Na
semana passada, tivemos uma reunião para termos um sistema
de informação compartilhado sobre a situação
das mulheres na América Latina, em diferentes áreas,
para que possamos ter políticas integradas", salientou
a ministra.
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