Sustentabilidade da indústria do papel precisa
ser garantida
Embora
muitos tenham previsto que os computadores acabariam com a escrita,
o mundo nunca consumiu tanto papel. No Brasil, foram 7,9 milhões
de toneladas produzidas em 2003, dentre as cerca de 330 milhões
de toneladas no mundo, com crescimento médio anual de 3%.
A indústria do papel, consumidora voraz de celulose, energia
e água, exige planejamento para diminuir cada vez mais os
danos que seus processos de produção causam ao meio
ambiente. Uma das alternativas é a utilização
crescente do papel reciclado que, nacionalmente, já representa
três milhões de toneladas por ano. O papel sintético
promete ser uma alternativa à celulose como matéria
prima, mas ainda é pouco utilizado no Brasil.
O
pesquisador Angeles Blanco e colegas, da Universidade de Madri,
na Espanha, analisaram os desafios que a indústria do papel
enfrentam para se tornar sustentável, em artigo
que acaba de ser publicado na revista científica Environmental
Science and Technology. Muitos dos mais de 500 produtos que
dependem do papel como matéria-prima exigem fibras longas
e virgens, que são adquiridas a partir da madeira, o que
exige a adoção de certificados que garantam a sustentabilidade
destas florestas - até 2002, elas representavam apenas 3,2%
das áreas florestais no mundo, a maioria localizada em países
desenvolvidos. Países como o Brasil, Bolívia, Guatemala
e México, foram os únicos listados pelos pesquisadores
com áreas pouco maiores que 100 mil hectares certificadas.
Os pesquisadores, no entanto, estão otimistas e acreditam
que a indústria da madeira tem tido iniciativas importantes
em prol da sustentabilidade de recursos e do meio ambiente e que
até 2050 a extração de fibras de madeira de
reflorestamento chegará a 50%. Hoje é apenas 20%.
Os
certificados, porém, não eliminam os principais obstáculos
postos à indústria do papel. O transporte, por exemplo,
responde por 10 a 20% do custo final do produto, e a energia, chega
a 25%. Tanto um quanto o outro, contribuem para a emissão
de gás carbônico (um dos causadores do efeito estufa),
SO2 e NOx (contribuem para a chuva ácida) na atmosfera em
forma de material particulado, sem contar os resíduos de
matéria orgânica, nitrogênio e fósforo
(podem provocar redução de oxigênio e matar
organismos) nos leitos do rio. Segundo o balanço feito pelos
cientistas de Madri, desde 1980, as emissões de gases na
atmosfera e o consumo de água foram reduzidos em pelo menos
80%, mas ainda é necessário desenvolver métodos
para tornar o produto ainda eficiente energética e economicamente.
|
Papel
reciclado ainda é a melhor alternativa para a sustentabilidade
Crédito: Angeles Blanco e colegas
|
Uma
das alternativas para complementar a fabricação de
papel virgem é o uso de fibras vegetais curtas (como o caule
de alguns cereais), que podem chegar a 33% em países em desenvolvimento,
mas cuja sustentabilidade do processo não é viável
economicamente, alertam os autores do artigo, em função
da dificuldade de tratamento dos resíduos tóxicos
produzidos. Assim, a principal aposta fica por conta do material
reciclado, que pode ser reutilizado de três a cinco vezes
e que em 2010 deverá totalizar, de acordo com previsões
de especialistas, cerca de metade das fibras utilizadas no mundo
na fabricação de papel. Hoje, nos Estados Unidos e
na Europa esse valor chega a 40%, e no Brasil ultrapassa um pouco
este percentual. O papel reciclado, de uma só vez alivia
o problema dos depósitos de lixo e funciona como fonte de
energia (biomassa) para a própria indústria.
Sintético
Embora tenha surgido há mais de 40 anos, o papel sintético
ainda procura conquistar seu espaço no mercado internacional.
Considerado menos poluente e agressivo ao meio ambiente, além
de mais resistente e impermeável à água do
que seu concorrente celulósico, o papel sintético
ainda encontra resistência pelos consumidores. Ele é
indicado para painéis de propaganda, embalagens, mapas, rótulos,
documentos pessoais e outros. No Brasil, ele é usado nas
notas de dez Reais brasileiras, mas ainda custa o dobro do preço
e sua impressão é mais demorada. Marcelo Almeida e
Sati Manrich, do departamento de Engenharia de Materiais da Universidade
Federal de São Carlos (UFSCar) estimaram em artigo,
em 2002, que haveria uma demanda de até 2,8 mil toneladas
deste produto no país, mas que seria importante investir
em marketing do produto para que o consumidor pudesse se familiarizar
e contribuir para que o preço fosse reduzido.
Manrich
observa que as empresas que fabricam filmes para embalagens têm
entrado no mercado de papel sintético. "Antes havia
muitos produtos importados, agora aumentou a produção
nacional; assim, acredito que o custo do papel sintético
tenha reduzido", afirma a pesquisadora. Ela e sua equipe estão
apostando no desenvolvimento de papéis derivados de matéria-prima
reciclada, para se ter mais opções de técnicas
e fontes de materiais a favor de uma produção sustentável.
"Já conseguimos produtos viáveis e um depósito
de patente de estudos laboratoriais. Para 2005 deveremos testar
em escala piloto", revelou.
No
entanto, no ano passado, houve um movimento do setor de celulose
e papel no sentido de ampliar ainda mais sua capacidade produtiva
que o coloca hoje como o 11o do mundo. Assim, foi apresentado ao
presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seus ministros o Programa
de Investimento no valor de US$ 14,4 bilhões, para o período
de 2003 a 2012. Desde 1990 as exportações triplicaram,
passando de US$ 1 bilhão para US$ 3,1 bilhões, com
a aplicação de US$ 12 bilhões feitos pela indústria
para a ampliação de sua capacidade.
Segundo
dados da Associação Brasileira de Papel e Celulose
(Bracelpa), existem 220 empresas de celulose e papel espalhadas
por 16 estados brasileiros encarregadas de produzir os cerca de
38,2 quilos de papel consumidos anualmente por habitante, somando
6,8 milhões de toneladas para o consumo interno.
Desde
2001, várias indústrias de papel introduziram o Perfil
do Papel, onde divulgam seus sistemas de administração
do meio ambiente, uma espécie de ISO 14001 que descreve a
procedência do papel desde a coleta da matéria prima
até a produção do produto. Angeles Blanco e
seus colegas acreditam que esta será a tendência para
que no futuro os consumidores possam optar por produtos que nacionais
e internacionais que atendam aos mesmos padrões de sustentabilidade.