Influência da mídia sobre processo eleitoral
deve ser relativizada
Com o encerramento das eleições municipais nesse último
domingo, hipóteses e teorias para explicar os resultados,
principalmente os obtidos nas principais capitais do país,
tornam-se recorrentes. Dentre as explicações levantadas,
o papel da mídia e a possível influência dos
meios de comunicação na decisão dos eleitores
são lembrados nas discussões sobre o peso do horário
gratuito de propaganda eleitoral, os debates televisivos, o espaço
concedido pelos jornais a cada um dos candidatos ou mesmo as estratégias
de marketing utilizadas por cada um eles. Um elemento tende a ser
pouco discutido: o impacto que a própria configuração
dos sistemas eleitoral e político-partídário
tende a provocar no eleitorado brasileiro, principalmente no que
diz respeito à escolha para os cargos legislativos.
Essa
discussão é relevante tendo em vista uma das principais
pautas da agenda do governo Lula: a reforma política. Questões
como fidelidade partidária, delimitação da
concorrência entre partidos - não mais entre candidatos
individuais - financiamento das campanhas, proibição
de coligações, e outros itens, deverão ser
os alvos da reforma política que o governo pretende realizar
em 2005.
Sistema
eleitoral
O impacto dos meios de comunicação sobre o processo
eleitoral constitui, desde o início do século XX,
uma importante linha de pesquisa na Ciência Política,
sobretudo nos Estados Unidos. As pesquisas e a literatura européia,
que também tratam da influência da mídia sobre
o processo eleitoral, tendem a ressaltar o efeito que os meios de
comunicação, sobretudo os eletrônicos, vêm
provocando nas competições eleitorais: a personalização
das disputas e o enfraquecimento dos partidos políticos.
No entanto, Luis Felipe Miguel, da Universidade de Brasília,
em artigo publicado na última edição da revista
Opinião
Pública, afirma que o declínio dos partidos
e a personalização da competição política,
no caso brasileiro, seriam efeitos do próprio sistema eleitoral.
Aos meios de comunicação de massa - a situação
de oligopólio privado dos meios de comunicação
no país e o peso diferenciado da televisão na sociedade
brasileira.
A
chamada personalização da política, que faz
com que os eleitores, muitas vezes, julguem os políticos
por critérios de personalidade em detrimento dos partidos
políticos aos quais eles pertencem, seria uma característica
histórica do sistema eleitoral e político-partidário
brasileiro. A ação dos partidos no parlamento tende
a ser fragmentada e, no geral, eles conquistam pouca lealdade entre
o eleitorado. "As legendas partidárias não são
importantes para a elite política, que se utiliza delas conforme
as conveniências de momento, nem para uma grande fração
do público, que não se preocupa com elas na hora de
fazer sua opção eleitoral", enfatiza Miguel.
O
pesquisador destaca que o sistema de representação
proporcional baseado nas listas abertas estimularia a competição
intrapartidária nas eleições legislativas,
tais como as para vereador, que ocorreram há um mês
no país. Estas listas também provocam, de acordo com
o cientista político, a debilitação dos partidos
políticos, uma vez que os votos recebidos tornam-se patrimônio
pessoal dos candidatos que, assim, ganham poder de negociação
e mobilidade, podendo transitar de uma legenda partidária
para outra, esperando carregar consigo os seus eleitores. Além
desses elementos, o enfraquecimento dos partidos seria provocado
pelas regras extremamente permissivas para as coligações
eleitorais baseadas na baixa exigência de filiação
partidária e na ausência de imposição
legal de fidelidade partidária no exercício do mandato
parlamentar.
Poder
da mídia
Aliado à personalização da política
e à volatilidade dos partidos é que o papel dos meios
de comunicação no processo eleitoral ganha relevância,
sobretudo a centralidade da televisão em relação
aos outros meios. A Rede Globo, por exemplo, detém mais da
metade da audiência do país. Nos Estados Unidos, apesar
da tendência a fusões entre grandes corporações
de comunicação, a audiência da televisão
aberta vem se pulverizando, desde o surgimento de uma quarta competidora
(a Fox), em um cenário antes dominado por apenas três
grandes redes (CBS, ABC e NBC). Em ambos os países e na Europa,
o noticiário de televisão é mais importante
do que a imprensa escrita como fonte de informações.
No
caso do Brasil e de outros países da América Latina,
o pesquisador lembra que é preciso levar em conta a combinação
entre a grande penetração da mídia eletrônica
de massa - em níveis que se aproximam aos dos países
desenvolvidos - com a precária cobertura da educação,
que muitas vezes cumpre mal sua tarefa de socialização
de conhecimentos e exclui um largo contingente da população.
Essa grande penetração da mídia eletrônica,
aliada à ausência ou à deficiência da
escolaridade no Brasil, tornaria o eleitorado mais suscetível
e menos crítico em relação ao conteúdo
veiculado pela televisão.
Para
saber mais:
- Mídia
desempenha papel cada vez mais importante na prática política